
A aula tinha acabado, mas Mariapa não foi embora. “Professora, meu avô fez de novo”, disse ela, quase chorando. “E ele vem me buscar hoje. Eu não quero ir.” Lúcia sentiu o coração disparar, mas tentou manter a calma. “O que ele fez de novo, minha menina? O que ele está fazendo com você?” Mariapa mordeu o lábio sem olhar para a professora. Quando minha mãe está dormindo, ele entra no meu quarto, diz que é segredo e que, se eu contar, minha mãe vai ficar brava comigo.
Estou com medo de doer. As últimas palavras pesaram no ar. Lúcia respirou fundo, segurou as cabecinhas de Mariapia e falou com firmeza: “Você está segura comigo? Não vou deixar que ele te ouça.” Ela discretamente pegou o celular e ligou para a polícia, falando baixinho. Explicou a situação, deu o endereço da escola e pediu uma viatura. Disseram-lhe para manter a menina segura e não para levá-la para ajudá-la até que os pais ou as autoridades chegassem.
“Você vai ficar comigo, tudo bem”, disse Lúcia, tentando manter a calma. “Eu não quero ir com ele”, repetiu Mariapia, quase chorando. Lúcia a abraçou com força e a colocou atrás da mesa, protegida. Poucos minutos depois, um forte cheiro de café ecoou pela chegada de Rogelio. Ele murmurou, sorrindo. “Bom dia, professora. Estou aqui para a minha neta”, disse ele, abrindo os braços como se fosse a coisa mais normal a se fazer. Lúcia se levantou e ficou em frente à menina. “Os oficiais de hoje estão ocupados com pais, Sr. Rogelio.”
É o protocolo da escola. Seu sorriso se estreitou. “A mãe dela me pediu para vir. Eu sempre a pego. Tudo bem. Vamos, Mariana.” A menina apertou o caderno contra o peito e balançou a cabeça. “Eu não quero ir, vovô. Eu não quero.” A diretora Carmen apareceu no corredor, tentando diligentemente acalmar a situação. “Tio Rogelio, podemos conversar um pouco na sala de coordenação?”, ela sugeriu. “Conversar sobre o quê?”, ele respondeu impacientemente. “Só vou levar a menina, ponto final.”

Lúcia manteve a voz firme. “Ela me contou umas coisas muito sérias. Até que tudo se esclareça, não vou deixá-la ir embora.” Rogelio deu um passo à frente, seu sorriso agora congelado. “Professora, não faça essas coisas. As crianças falam demais. Você vai mesmo me impedir de levar minha neta.” Mariapia ergueu o rosto, com lágrimas escorrendo pelo rosto. “Não é nada demais. Você está vindo para o meu quarto. Você disse para não falar.” O silêncio se tornou insuportável. Carmen hesitou, não ousou intervir.
Lúcia permaneceu firme, bloqueando o caminho. “Ele não vai levá-la”, disse ela, olhando diretamente para ele. “Já chamei a polícia e ela vai ficar aqui até os responsáveis chegarem.” Rogelio estreitou os olhos, deixando-os longe o suficiente para que Lúcia pudesse ouvi-lo. “O senhor não sabe com quem está se metendo, professor. O senhor vai se arrepender.” Do corredor, o estalo de um rádio da polícia cortou o teto. Passos apressados se aproximaram e alguém bateu duas vezes na porta. O kпob começou a girar.
Dois policiais uniformizados entraram na sala de aula, avaliando rapidamente a cena. A menina estava escondida atrás da carteira, a professora a observava firmemente, a diretora pálida ao seu lado, e Rogelio, franzindo a testa. “Bom dia. Recebemos uma ligação sobre uma situação potencialmente perigosa com um aluno”, disse o policial em voz firme. Rogelio ergueu a cabeça e falou rapidamente, esperando dominar a cena. “Isso é um absurdo. Sou o avô da menina. Vim buscá-la como padrinho.”
“Essa professora está fazendo umas coisas e não me deixa levar minha neta”, Carmela se apressou em confirmar vigorosamente. “Sim, policiais. O Sr. Rogelio certamente vem buscá-la.” Talvez tenha sido um engano. Lúcia permaneceu firme diante da menina, com a voz confiante, embora seu coração estivesse agitado. Havia muito engano. A aluna me procurou e me contou coisas muito sérias sobre seu avô. Pedi ajuda porque não podia correr o risco. Os dois policiais se entreolharam por um momento. O mais novo se aproximou de Mariapa.
Ele se abaixou até a altura dela. “Olá, pequena. Como vai? Pode me dizer se quer ir com seu avô agora?” Mariana balançou a cabeça vigorosamente, com lágrimas escorrendo pelo rosto. “Eu não quero ir. Eu não quero.” A resposta ecoou pela sala de aula. Rogelio tentou sorrir, mas a raiva era evidente em seu rosto. “As crianças dizem coisas quando estão com medo. Este é o caso da Professora Rosa. A mãe dela confia a menina a mim todos os dias. Pergunte a ela”, disse Rogelio. O policial se levantou.
É exatamente isso que vamos fazer. Vamos contatar os pais imediatamente. Na hora do jantar, a garota não está com ninguém. Rogelio a abraçou, sem entender. “Mas isso é tudo. Eles vão me tratar como um criminoso por causa da minha neta.” “Doutor Rogelio”, respondeu o oficial superior, calmo, mas firme. “Até que tudo seja esclarecido, a prioridade é a segurança do menor.” Lúcia deu um suspiro de alívio pela primeira vez, mas não abaixou a guarda. Rogelio lançou-lhe um olhar pesado, como se prometesse vingança.
Na saída da escola, a cena captou a atenção dos pais e funcionários que ainda estavam lá. Rogelio caminhava, escoltado por policiais, gesticulando, enquanto a Diretora Carmen tentava derrotá-lo. Mariana agarrou a cabeça da professora, com os olhos vermelhos de tanto chorar. Os policiais permaneceram firmes. A menina não saiu até os pais chegarem. Poucos minutos depois, Estebaú apareceu paciente, direto do trabalho. Rosa chegou imediatamente, perturbada. “O que está acontecendo aqui?”, perguntou Estebaú, olhando da filha para Rogelio e, de volta, para os policiais.
Vamos conversar na casa deles, disse o policial. Precisamos verificar a situação e ouvir os responsáveis. Todos caminharam juntos, escoltados. Rogelio caminhava em silêncio, com o maxilar cerrado, enquanto Mariana permanecia atenta à professora como se ela fosse seu único refúgio. A viatura parou em frente à pequena casa da família. Tudo parecia normal. Flores crescidas no jardim, cortinas fechadas, cheiro de comida no ar. Mas o tesoureiro os havia seguido da escola. Rosa abriu a porta rapidamente, o rosto pálido e os olhos apreensivos.
“O que aconteceu?”, perguntou ela, olhando primeiro para o pai e depois para a filha. “Qual é o problema todo?” Rogelio falou primeiro, com falsa percepção. “Essa professora me fez perder tempo. Ela disse que eu não podia buscar minha neta. Ela até chamou a polícia. Você acredita nisso, Rosa?” Rosa olhou para Lúcia e os policiais, respirando pesadamente. “Professora, eu não entendi. Meu pai sempre me ajuda. Sem ele, eu não conseguiria trabalhar. Ele sempre busca Mariana.” Lúcia respirou fundo antes de responder. “Eu entendi sua surpresa, senhora, mas Mariana me disse que não queria ir com o avô.”
Ela recordou coisas que não conseguia ignorar. Teve que ligar para as autoridades. Rosa olhou para a filha, que ainda estava silenciosamente abraçada à perna da professora. “Maria, é verdade?”, perguntou ela, com a voz trêmula. A menina não respondeu, apenas escondeu o rosto no vestido de Lúcia. Estebaú, que a observava de trás, deu um passo à frente. “Rosa, você não vê que ela está com medo? Isso não é normal. Estebaú, por favor, ela é uma criança, pode ter entendido mal”, disse Rosa, evitando o olhar dele.
“Papai jamais a machucaria.” “Nunca.” Estevão ergueu a voz, olhando para o sogro. “Então por que ela está assim?” Os policiais interromperam a discussão. “Precisamos registrar um boletim de ocorrência. A menina será ouvida no momento oportuno, com acompanhamento. Ao mesmo tempo, pedimos que ela não seja deixada sozinha com o avô até uma nova avaliação.” Rogelio ergueu a cabeça com um gesto de calma fingida. “Claro, senhores policiais, eu entendi, mas peço que não destruam a confiança da minha neta em mim. Sou eu quem mais cuida dela quando os pais dela não podem.”
Ele disse isso com uma doçura ensaiada, como o dedo de um avô exemplar, embora seu olhar fosse duro. Rosa exclamou como se quisesse acreditar em cada palavra. “Vamos lá, ele é o pilar da família. Sem ele, eu não sei o que faríamos”, disse ela, quase em lágrimas. Estevão cruzou os braços, encarando o sogro. “Talvez seja hora de descobrir o que realmente está acontecendo nesta casa.” O boletim de ocorrência foi retirado. Os policiais saíram com a promessa de voltar. Quando a porta se fechou, o silêncio pesou.
Mariapia abraçou a mãe, mas seus olhos procuravam a professora. Antes de sair, Lúcia se aproximou e sussurrou: “Vou ficar por perto”. “Sim, ela não está sozinha.” Do outro lado da sala, Rogelio observava em silêncio, com um sorriso falso demais para ser sincero. Dois dias após o acidente na escola, a polícia levou Mariapia ao centro especializado para seu depoimento. O prédio era simples, mas havia bastante espaço. Paredes cobertas de desenhos infantis, brinquedos espalhados pelo chão, livros infantis em prateleiras baixas.
Nada, porém, escondia o peso do que estava para ser dito ali. Lúcia esperava no corredor, inquieta, andando de um lado para o outro. Sentia-se responsável, como se toda a culpa da situação tivesse caído sobre seus ombros. À frente, Rosa e Estevão esperavam em silêncio, cada um perdido em seus próprios pensamentos. Sua mãe, com o rosto cansado, os dedos trêmulos brincando calmamente com o equipamento; seu pai, com os braços cruzados e o maxilar rígido.
Incapaz de esconder sua angústia. Rogelio, doente, não apareceu, mas sua ausência era tão calculada quanto a imagem de uma pessoa respeitável que ele tentava manter. A psicóloga que conduziria a sessão abriu a porta e chamou Mariapa. A moça caminhou lentamente, com os olhos baixos. A profissional não fez perguntas diretas imediatamente. Sentou-se no tapete e ofereceu-lhe papel e pedaços coloridos. “Você pode desenhar o que quiser, Mariapa. Você está segura aqui.” A moça permaneceu em silêncio por vários minutos.
Ela desenhou uma cama, uma porta e uma figura masculina enorme ao lado da cama pequena. A psicóloga observou sem interromper. Só então ela perguntou: “Você me disse que não queria ir com seu avô. Por quê?” Mariapa abaixou a cabeça por um momento, respirou fundo e respondeu em voz baixa: “Por que ele vem ao meu quarto quando minha mãe está dormindo?” A psicóloga não reagiu imediatamente; apenas gesticulou para que ela se deitasse. E o que acontece quando ele vem? Mariapa desviou o olhar e amassou o papel.
Ele diz que é segredo, que se eu contar, minha mãe vai ficar brava comigo. Lá fora. O silêncio se tornou pesado. Estevão fechou os olhos, a respiração entrecortada. Lúcia sentiu as pernas tremerem. Rosa, por outro lado, balançou a cabeça como se tentasse apagar aquelas palavras do ar. “Crianças fazem as coisas acontecerem. Às vezes, elas confundem o sonho com a realidade”, murmurou Rosa com uma voz fraca, mas contida, agarrando-se à ideia de que tudo aquilo era uma confusão. Ela pronunciou a declaração com cuidado, sem pressionar a garota além do que era suportável.
O psicólogo observou que havia sinais consistentes de risco, mas ainda não havia evidências diretas suficientes para remover Rogelio imediatamente. O procedimento levaria tempo. Ao saírem, Estebaú encarou a esposa. “Você ainda vai dizer que ele sonhou, que é tudo imaginação dele.” Rosa desviou o olhar, enxugando discretamente uma lágrima. “Não acredito nisso. É meu pai, Estebaú. Meu pai.” Estebaú não respondeu. Ele apenas olhou para Mariana, que estava caminhando com Lúcia, agarrando-se a ela, como se ela fosse a única pessoa em quem realmente confiava.
Na manhã seguinte à declaração, Lúcia caminhou até a escola, aliviada com as palavras de Mariapia. A imagem da garotinha dizendo: “Venha para o meu quarto enquanto minha mãe está dormindo!” não saía da sua cabeça. Ela se sentiu compelida a agir, embora soubesse que cada passo aumentava a tensão dentro da comunidade escolar. Pouco depois, Rosa apareceu na escola para deixar a filha. Seu rosto estava sério, seus olhos vermelhos por não terem dormido a noite toda.
Lúcia se aproximou dela com cuidado, mas sem esconder a firmeza. Rosa, precisamos conversar. O que Mariana nos contou não pode ser ignorado. Ela está mostrando sinais claros de sofrimento. Rosa respirou fundo, quase explodindo. Professora. Você está se empolgando. Mariana é só uma criança. Ela está dizendo coisas que não entende. O pai Rogelio sempre cuidou dela. Ele sempre esteve lá. Eu dependia dele. Você entendeu?, disse ela, com a voz trêmula. E agora você está jogando todo mundo contra você. Não estou contra você, Rosa.
Estou do lado da sua filha. Você viu como ela reagiu. Ela está assustada. Não é invenção, insistiu Lúcia. Rosa se virou bruscamente, apontando o dedo para a professora. “Você está inventando coisas. Você encheu a cabeça dela de histórias. Meu pai jamais a machucaria. Eu o conheço. Você não sabe do que está falando.” As vozes altas captaram a atenção de alguns pais que ainda estavam no pátio. Naquele momento, a diretora Carmen apareceu, tentando controlar a situação com um sorriso falso.
Vamos manter a calma, por favor. Professora Lúcia, não é apropriado discutir essas questões no portão da escola. Lúcia endireitou os ombros. Principal, o aluno está em risco. A polícia já foi notificada. Não podemos prever o acontecimento de outra pessoa. Carmen a interrompeu autoritariamente. O que não podemos fazer é manchar a reputação da escola com acusações falsas. Já há policiais envolvidos, já há relatos. Nosso papel agora é proteger a imagem da instituição e o trabalho de corte.
Proteja a imagem, Lúcia zombou. E quem protege a menina? Rosa usou a intervenção da diretora como apoio. Viu? Até a diretora sabe. Você está exagerando. Ela é professora, não pesquisadora. Lúcia sentiu o sangue subir ao rosto. Ela estava corada. De um lado, sua mãe estava em delírio, do outro, a administração tentando silenciá-la. Mas quando olhou para Mariana, que estava escondida atrás da saia da mãe, com os olhos marejados de lágrimas, ela renovou sua determinação.
Podem tentar me silenciar, podem duvidar de mim, mas não vou desistir dessa garota. Ela confiava em mim, e eu não vou deixá-la em paz. O silêncio caiu pesadamente sobre o trecho. Rosa puxou a filha pelo braço e saiu da escola de cabeça baixa, sem olhar para ninguém. Carmen suspirou e ligou para Lúcia na secretaria. O conflito estava apenas começando, mas já estava claro. A professora não parava, mesmo que todos estivessem contra ela.
Dawp caiu silenciosamente sobre a casa. Esteba estava na cama, mas o sono não vinha. Desde a declaração da filha, algo dentro dele não parava de pulsar. Mariapa era uma garota que inventava histórias, muito menos uma que chorava pela menor coisa. A lembrança de sua voz trêmula ecoou em sua cabeça. Ela entra no meu quarto enquanto minha mãe dorme. Ele se levantou da cama e olhou para o lado. Rosa dormia profundamente, com o rosto pressionado contra o travesseiro, como se buscasse escapar da realidade e do sono.
Estebaú suspirou e se levantou para beber água. Foi nesse momento que ouviu um leve ruído no corredor. O som era quase imperceptível, mas era o suficiente para fazer seus pés rastejarem. Ele caminhou lentamente, os pés descalços evitando que o piso de madeira rangesse. Aproximou-se do quarto da filha. A porta estava entreaberta, e bem ali, parado como uma sombra, estava Rogelio. A velha não percebeu imediatamente a presença de sua sogra. Estebaú parou por alguns segundos, observando.
Seu coração batia forte, sua mente buscava explicações, mas ele se acalmou. Rogelio perguntou em voz baixa para não assustar a garota. O homem se virou lentamente, ajustando o cobertor no braço. “Ah, Esteba. Eu estava cobrindo a garota. Ela se mexe muito à noite. O cobertor cai, e eu não queria que ela pegasse um resfriado.” Esteba estreitou os olhos. Às 2h da manhã e sem dizer nada, Rogelio forçou um sorriso. “Eu sempre verifico quando fico aqui.”
Nós, velhos, temos sono leve, sabia? Só me preocupo com a minha neta. Estevão ficou de pé, mas não respondeu. Ele olhou rapidamente para o quarto. Mariana estava deitada imóvel, como se tivesse visto a presença de alguém e estivesse prestes a dormir. Seu peito ardia de raiva, mas ele não queria acordá-la com um argumento. “Ok, mas da próxima vez, me deixe saber. Não quero surpresas em casa”, disse Estevão secamente. Rogelio, ainda com aquele sorriso falso, dirigiu-se ao quarto de hóspedes.
Estevão ficou um momento parado na porta da menina. Olhou para o corpinho dela sob o cobertor, o rosto voltado para a parede. Queria ir até lá, acordá-la, abraçá-la, mas tinha medo de piorar a agonia que ela já carregava. Retornou ao quarto, mas não conseguiu dormir. Deitou-se com os olhos arregalados para a escuridão, cada som da casa mais alto que podia. Em sua mente, havia apenas uma certeza: algo profundamente ruim estava acontecendo sob seu próprio teto.
Desde aquela noite, ela não conseguia mais descansar. À medida que a manhã avançava, Lúcia notava que Mariapa estava ainda mais retraída. A menina evitava o recreio. Preferia ficar na sala de aula, olhando fixamente para a porta, como se esperasse que alguém aparecesse de repente. Durante a aula de artes, enquanto seus colegas desenhavam árvores, casas e animais, Mariapa permanecia em silêncio, movendo lentamente sua peça sobre o papel. Enquanto todos estavam satisfeitos com seus trabalhos, ela se aproximou da professora hesitante e estendeu a folha de papel dobrada em quatro.
“Professora, é para você, mas não mostre para ninguém”, disse ela, com a voz quase abafada. Lúcia abriu-o lentamente. O desenho era simples, com traços infantis, mas transmitia algo perturbador: uma cama pequena, uma porta aberta e, ao lado, a figura de uma mulher alta. O detalhe mais marcante era o olhar da figura. Dois pontos pretos exagerados desenhavam com tanta força que quase rasgavam o papel. “Maria, é esse o desenho que você me contou?”, perguntou Lúcia, cautelosa.
A garota se assustou, com os olhos marejados de lágrimas. Ele ficou parado ali. Lúcia engoliu em seco, colocou o papel em uma pasta e abraçou a aluna. Não disse mais nada; apenas a acompanhou de volta para a sala de aula, tentando acalmá-la. Assim que teve um descanso, correu para a delegacia e entregou o desenho aos investigadores. O policial que a atendeu olhou para a folha de papel por alguns segundos antes de suspirar. “Professora, sabemos o peso disso, mas legalmente ainda é fraco.”
As crianças desenham o que imaginam. Pode ser interpretado de várias maneiras, mas não é apenas um desenho; complementa o que ela disse. A menina está apavorada, insistiu Lúcia. O policial anotou isso no boletim de ocorrência, acrescentando as informações ao histórico do caso. Vamos registrar, é claro. Serve como reforço para medidas protetivas, mas para algo mais sólido, precisamos de provas diretas. Depoimento clínico, laudos periciais, um crime flagrante, sabe o que quero dizer? Lúcia saiu da delegacia com uma pasta vazia e uma sensação de impotência.
Eu sabia que estava no caminho certo, mas ainda não era o suficiente. E a cada dia que passava, Rogelio cochilava, caminhando livremente, como se tudo tivesse acontecido. Naquele dia, quando fui buscar minha neta, ele apareceu na escola com a mesma postura imponente. Cumprimentou a Principe Carmen com gentileza, como se fosse um avô exemplar. Olhou para Lúcia de longe, e o sorriso discreto que lhe lançou parecia um aviso: Nada me impedirá. A mesa estava posta como uma noite normal.
O cheiro de arroz fresco e carne cozida enchia a casa, mas todos pareciam estar com apetite. Rosa se esforçou para manter a rotina, arrumando pratos e talheres como se o gesto pudesse apagar o passado dos últimos dias. Mariana sentou-se em silêncio, com os ombros caídos, o olhar fixo no prato vazio. Rogelio saiu da sala de hóspedes, ajeitando o paletó. Esteban já estava à mesa, com o rosto sério. “Vamos fazer algo em paz, por favor”, pediu Rosa, tentando sorrir.
Rogelio se serviu primeiro e, como sempre, aproximou sua cadeira da de Mariana. A moça se encolheu, mas disse outra coisa. Foi o suficiente para fazer Estevão perder a calma. “Rosa, você não vê como ela reage toda vez que ele a ouve?”, disse ele, olhando para a filha. Rosa suspirou, abaixando a cabeça. “Estevão, não comece. Você está vendo coisas onde não tem.” Vendo coisas. Ela mesma disse isso em sua declaração. Ela disse que ele vem ao quarto dela à noite.
“Você acha que é invenção?”, respondeu Estevão, com a voz cheia de imaginação. Rogelio interrompeu, erguendo o rosto como se fosse o dono da situação. “Olha, garoto, estou cansado disso. A menina sonha, ela diz bobagens, que você usa isso para me atacar. Desde que você entrou para esta família, parece que seu único prazer é me derrubar.” Estevão bateu o rosto na mesa. “Não minta, Rogelio. Eu te vi no corredor naquela noite. Não tente me enganar, você estava dando cobertura para a garota.”
Não às 2 da manhã. Mariana começou a tremer, com lágrimas escorrendo pela boca. Rosa, por sua vez, levantou-se e encarou o marido. “Pare com isso, Estevão, você está ficando louco. Ele é meu pai. Ele sempre ajudou, sempre esteve lá quando precisávamos dele. E como você queria que ele fosse um agressor. Eu queria proteger a minha filha!” Estevão gritou, com o sangue fervendo. Rogelio aproveitou a oportunidade e recostou-se na cadeira com um sorriso venenoso. “Olha, Rosa, o problema não sou eu.”
O problema é o ciúme do seu marido. Ele não suportava o fato de você ainda confiar em mim. Ele tem medo de perder o lugar na própria casa. As palavras soaram como cupidos. Rosa hesitou, torceu, enquanto Esteba ficou vermelho de raiva. Covardemente, Esteba deu meio passo à frente, mas se conteve. Você mapeia cada vez que sua filha. Rogelio riu baixinho, fingindo calma. Mapeia. Eu sou o único que realmente se importa. Se você chegar atrasado, estará sempre presente. Quem conta histórias de ninar para Mariaпa?
Quem a busca na escola? Quem cuida dela quando você não pode? Eu, sempre eu. As lágrimas de Mariana caíram silenciosamente, deslizando para o seu prato. Ela queria gritar, mas o medo a paralisou. Rosa, incapaz de suportar a cena, agarrou o braço do marido. Esteba, pare. Você está destruindo a família com essas acusações. Ele olhou para ela com incredulidade. Não sou eu, Rosa, é ele. Mas você ainda não quer vê-lo. Dier desapareceu em silêncio quebrado pelo choro suave da menina.
Rogelio voltou a comer em paz, como se tivesse travado outra batalha. Estevão, por outro lado, tinha certeza absoluta de que não descansaria até expor o sogro. Os dias seguintes à morte da família trouxeram trégua. Na escola, Lúcia notou alguém observando-a à distância, na rua. Um carro cinza permaneceu estacionado do outro lado da rua, próximo ao local. Ao sair, sentiu que alguém a observava até que ela desapareceu no corredor. Depois de morrer, ela encontrou um envelope com um endereço de devolução dentro de sua gaveta.
Ela abriu com os olhos trêmulos. Pare de envenenar a mente da minha neta. Professores que se metem onde não devem usam babosa. O papel cheirava a tabaco. Lúcia sabia exatamente de quem era. Naquele mesmo dia, a sala de aula ficou lotada depois do expediente. Ela respondeu, achando que era algum pai atrasado, mas uma voz profunda soou fria. Tome cuidado, professora. As crianças falam demais, mas os professores também podem aprender a ficar quietos. Lúcia estava abraçada, com o coração acelerado e as mãos suando, mas a decisão estava tomada.
Ela ia registrar tudo. Na delegacia, mostrou a nota e registrou as ligações. O escrivão anotou as notas, avisando que reforçariam o acompanhamento do caso. “Infelizmente, ameaças veladas são fáceis em situações como esta, mas registre tudo — hora, local, cada detalhe. Isso nos ajuda a construir um caso”, aconselhou o policial. Antes de voltar para a escola, Lúcia pensou que teria apoio, mas encontrou resistência. A diretora Carmen a chamou ao seu escritório, com a expressão pesada. “Professor, precisamos conversar. Esta situação já está ficando chata.”
Recebi ligações de pais coagidos, e até a secretária está pedindo explicações. O padre Rogelio é bem conhecido na comunidade; muitas pessoas o respeitam. Lúcia se manteve firme. “Principal, a menina é perigosa. Ela confiou em mim. Não posso ignorar isso.” Carmen suspirou em agradecimento. “Você não entendeu. Não podemos deixar a imagem da escola ser manchada por essa tragédia. É a nossa reputação que está em jogo. Sugiro que você se concentre em ensinar e deixe a investigação para a polícia.”
Lúcia sentiu a raiva aumentar. “Meu papel é proteger meus alunos. Se eu fechar os olhos, traio esta criança.” Carmela jogou a pasta na mesa com força. Então, encarei as consequências. “Não diga que eu não te traí.” Lúcia saiu da sala, o corpo tenso, mas a consciência limpa. Ela sabia que estava sozinha nessa luta contra Rogelio, contra o medo, até mesmo contra a própria liderança da escola. Mas, lembrando-se dos olhos marejados de Mariana, ela reafirmou para si mesma: “Eu não recuarei, aconteça o que acontecer.” A casa foi colocada em silêncio naquela manhã.
O relógio da cozinha marcava quase 3 horas quando Rosa se levantou. Seu sono era leve, interrompido por pesadelos que a assombravam desde a declaração da filha. Ela se revirou, tentando se convencer de que era tudo apenas um mal-entendido, que a criança era jovem demais para entender certas coisas. De repente, um som baixo a fez prender a respiração — um rangido no chão do corredor. A princípio, ela pensou que fosse Esteban, mas quando estendeu a mão, notou seu marido dormindo profundamente ao seu lado.
Seu coração disparou, ela se levantou cuidadosamente e caminhou até a porta do quarto. Abriu-a apenas uma fresta e viu a sombra de um homem caminhando em direção ao quarto de Mariana. A luz do abajur do corredor revelou a figura de Rogelio, avançando lentamente com passos medidos. Rosa sentiu um arrepio percorrer seu olhar. Ela congelou por alguns segundos, capaz de aceitar o que via. Seu próprio pai, a quem ela sempre defendera, caminhava na escuridão em direção ao quarto de sua neta.
Ela engoliu em seco e caminhou rapidamente, descalça, até alcançá-lo. “Papai!”, chamou ela, com a voz embargada. Rogelio se virou surpreso, mas se recompôs. “Rosa, não se assuste. Eu só ia cobrir a bebê. Ela se mexe, se cobre, você sabe como ela é.” Mas seus olhos não combinavam com seu olhar calmo; eram duros e frios. Rosa já havia notado aquele olhar até aquele momento. “A esta hora, sem te contar”, insistiu ela, com a voz trêmula. “Nós, velhos, não dormimos muito. Eu queria dar uma olhada na minha neta.”
“Você só está imaginando coisas”, disse ela, tentando passar por ela. Rosa, com o coração disparado, bloqueou sua passagem. Ela olhou para a porta entreaberta do quarto de Mariapia. A menina estava encolhida em cima da cama, fingindo dormir, mas seus ombros tremiam sob os lençóis. Foi naquele momento que tudo desabou sobre ela. O que antes parecia exagero da filha ou da professora estava agora diante de seus olhos. Havia muito mais para revelar.
Seu sangue gelou e sua garganta secou. “Ei, você também”, gaguejou ela, incapaz de escapar do seu lugar. Rogelio se aproximou, com a voz baixa e ameaçadora. “Cuidado com o que diz, Rosa, você não sabe do que está falando.” Ela deu um passo para trás, com as pernas trêmulas. Seu coração estava dividido entre o choque e a necessidade de agir. Ela queria gritar com Estevão, mas sua voz não saía. Ela apenas conseguiu empurrar o pai de volta para o corredor e bater a porta do quarto da filha.
“Nunca mais volte para perto dela”, ela conseguiu dizer, respirando entrecortadamente. Rogelio a encarou imóvel por alguns segundos antes de abrir um sorriso torto. “Você tem ideia do erro que está cometendo.” E calmamente voltou para o quarto de hóspedes, como se tudo tivesse acontecido. Rosa saltou contra a parede, pulando, o corpo tremendo. Pela primeira vez, ela viu a verdade que se recusara a aceitar. A imagem de sua filha chorando silenciosamente, implorando por proteção, agora se misturava ao rosto frio de seu próprio pai.
Ela saiu do quarto de Mariana, sentou-se na beira da cama e acariciou os cabelos da menina, com os olhos marejados de lágrimas. “Mãe, ele voltou, não é?”, sussurrou a menina. Rosa abraçou a filha com força, incapaz de responder. Lágrimas escorriam calmamente. O relacionamento que a havia mantido até aquele momento desmoronou repentinamente. O mundo que ela acreditava ter com o pai estava agora desmoronando diante dela.
Assim que o silêncio foi quebrado pelo choro abafado da menina, Rosa compreendeu que tudo voltaria a ser o mesmo. O silêncio da escuridão pesava sobre a casa. Mariana estava deitada na cama, mas não conseguia fechar os olhos. Desde o momento em que sua mãe surpreendeu seu avô no corredor, cada ruído parecia uma ameaça. O rangido de um móvel, o rangido da madeira, tudo soava como passos se aproximando. Abraçando o travesseiro, ela pensou no que Lúcia sempre lhe dizia.
Ela está segura aqui. Mas, em seu próprio lar, havia muita segurança. O medo era maior do que qualquer coisa. Ela sentia que, se ficasse lá, tudo acabaria. Com as mãos trêmulas, levantou-se lentamente, tirou a mochila escolar de debaixo da cama e vestiu um suéter. Abriu cuidadosamente a porta da viúva e saiu para o quintal, tentando fazer barulho. Seu coração batia forte, mas seus pés pareciam guiados pela sabedoria.
As ruas estavam desertas, postes de luz iluminavam trechos isolados da calçada, e o frio da manhã fazia seus dentes baterem. Mariapia caminhava rapidamente, olhando fixamente para trás a cada esquina, com medo de ver seu avô emergir da escuridão. Depois de alguns minutos, ela finalmente avistou a escola. O portão estava fechado. Mariapia se aproximou e implorou, gritando alto. “Abre, por favor, abre!”, ela gritou, quase sem voz. O porteiro, Padre Joaquíp, acordou assustado da cadeira de onde havia saído.
Ele se levantou lentamente, ajeitando os óculos, sem acreditar no que via. A pequena Mariapa, de pijama e mochila, tremia de frio lá fora. “Menininha, o que você está fazendo aqui a esta hora?”, perguntou ela, abrindo a quilha. “Você fugiu de casa?”, Mariapa correu até o portão, agarrando-se às grades. “Por favor, chame a professora Lúcia. Não quero voltar para lá.” Ele voltou. Ele veio para o meu quarto. As palavras saíram bufando, dilacerando o coração do velho zelador. Ele não pensou duas vezes.
Ela atendeu o telefone de emergência e ligou para o número da Lúcia, que morava a alguns quarteirões de distância. Professora. Desculpe acordá-la, mas a Mariana está aqui na escola. Sim, agora mesmo, no meio da noite, ela disse que não queria ir para casa. Poucos minutos depois, Lúcia chegou apressada, usando um casaco por cima do pijama. Ao ver a garota grudada no chão, ela imediatamente desmaiou. “Mariana”, exclamou ela, puxando-a para os braços. “Meu Deus, o que aconteceu?” Ela voltou para o lado. “Não aguento mais, professora.
“Não me mande de volta”, gritou a menina. Lúcia respirou fundo, tentando conter as lágrimas. Pegou o celular e chamou a polícia ali mesmo, sem hesitar. “Aqui é a Professora Lúcia. A aluna que denunciei está comigo na escola agora. Ela fugiu de casa de manhã cedo. Disse que o avô dela voltou para o quarto dela. Precisamos de uma viatura imediatamente.” Enquanto esperavam a chegada da polícia, o zelador trouxe um cobertor e uma garrafa d’água.
Mariapia aninhou-se no colo da professora, finalmente sentindo algum alívio. Quando as luzes da viatura iluminaram a rua, Lúcia percebeu que havia muito que recuar. A fuga desesperada de Mariapia era a prova viva de que a menina estava em perigo real. E como Rosa, Carmen ou Rogelio conseguiam alegar que era tudo imaginação dela. Enquanto isso, Mariapia procurou refúgio nos braços da professora, e a polícia já se dirigia para a escola.
Em casa, o amanhecer ainda era intenso. Rosa acordou assustada com o barulho constante do telefone. Era o boletim de ocorrência de que sua filha havia sido encontrada sozinha na escola, gritando por socorro. A voz era ríspida e direta. “Vamos levar a menina para a delegacia. Você deve comparecer imediatamente.” O chão pareceu desaparecer sob seus pés. Ela correu para o quarto de Estevão, que já estava acordando no quarto. “Maria fugiu de casa”, disse ele, com a voz embargada.
Estebaú deu um pulo, com os olhos arregalados de raiva e desespero. “Eu te avisei, Rosa, eu te disse que ela estava em perigo aqui.” Antes que pudesse responder, passos firmes soaram no corredor. Rogelio apareceu com a mesma postura imponente de sempre, ajustando as calças do pijama como se devesse a casa. Que gritos são esses? A garota deve ter voltado a gritar. Ela vai voltar logo, há muitos motivos para tanto alvoroço. As palavras foram como combustível para o fogo.
Rosa, com a lembrança da morte anterior fresca na mente, perdeu o controle. Drama. Ela fugiu no meio da noite, pai. Sete anos longe das ruas. Isso não é drama, é desespero. Rogelio tentou manter o pé calmo, mas sua voz já estava carregada de impaciência. Rosa, você sempre foi exagerada desde criança. Agora deixe aquela professora colocar ideias na sua cabeça. Não, pai! Ele atirou, jogando o cabelo para fora da mesa. Eu vi com meus próprios olhos. Eu o vi fora do quarto dela naquela noite.
Vi o medo nos olhos da minha filha. Estevão avançou, o rosto vermelho de raiva. Ah, o que você vai dizer? Que era também para encobrir a culpa dela. Você é um covarde, Rogelio, um covarde que se esconde atrás da confiança da própria família. A velha respirou fundo, mas a máscara se quebrou. O sorriso paternal desapareceu, dando lugar a um olhar sombrio. Cuidado com o que diz, rapaz. Esta casa existe porque eu a apoio. Se eu esperar, amanhã eles estarão fora da rua.
Rosa chorava, o corpo todo tremendo. “Moey não importa, ajuda não importa. Eu vou deixar você vê-la de novo. Nunca mais.” Rogelio se aproximou da filha, com o dedo erguido, a voz carregada de ódio. “Você vai se arrepender de ter cuspido no prato que comeu a vida toda. Nada para mim.” Esteban o empurrou de volta, quebrando o último fio de silêncio. “Chega. Aquela garota não é sua, e como a polícia sabe.”
Pretérito era muito mais útil. Tesíope encheu a sala. Rosa Soyosaba saltou contra a parede como se todo o peso de sua oferta tivesse caído sobre ele. Rogelio, com seu orgulho ferido, bateu na mesa, com os olhos em chamas. “Eles estão destruindo esta família”, gritou, cerrando o punho. “Eles estão me difamando.” Naquele momento, o telefone disparou novamente. Estebaú respondeu. As vozes do outro lado soaram firmes. “Sr. Estebaú, já formamos o tribunal juvenil.
O DIF (Distrito de Iquitos) foi notificado. Precisamos que a família esteja preparada. Estevão se levantou lentamente, com o olhar fixo no sogro. “Eles ligaram para o conselho. A culpa é do Rogelio. Agora é só entre nós.” O velho ficou em silêncio por alguns segundos. Então, ele sorriu de lado, com uma expressão fria e sem vida. Retornou ao quarto de hóspedes sem dizer uma palavra, deixando para trás o rastro de medo e destruição que finalmente começava a vir à tona. Na sala de estar, Rosa caiu de joelhos, abraçando-se.
Estebá a ajudou a subir, mas sabia que a contenção era apenas o começo de uma batalha muito maior. A família já estava falida e a justiça estava fora de cena. A manhã seguinte parecia pesada, abafada por um silêncio que parecia sufocar a casa. Pouco depois das 8h, uma viatura policial parou em frente ao portão, acompanhada por uma viatura da DIF. O som da campainha ressoou como um sino. Estebá abriu a porta com uma expressão cansada. Rosa estava sentada no sofá, pálida, com os olhos inchados de tanto chorar.
Rogelio, por outro lado, permaneceu como um observador de braços cruzados, um mero espectador, embora todos soubessem que ele era o centro da tempestade. Dois conselheiros se aproximaram, prevendo a ordem de proteção de emergência. A decisão foi clara: Mariana precisava ser imediatamente removida da casa até que a investigação pudesse progredir. A menina apareceu na sala de estar, agarrada ao seu ursinho de pelúcia, com os olhos arregalados. Percebendo o que estava acontecendo, ela correu para os braços da mãe.
“Mãe, não me deixe sozinha, por favor!”, gritou Mariapa, agarrando-se desesperadamente a Rosa. Rosa chorou silenciosamente, sem forças para lutar contra a decisão. Um conselheiro se abaixou para falar com a menina. Mariapa, você não ficará sozinha. Você vai para um lugar seguro, com pessoas que cuidarão de você até que tudo fique bem. Só vai ficar por um tempo. Sim. A voz suave não conseguiu acalmá-la. Rosa, entre gritos, tentou consolá-la. Filha, vai ser melhor assim. É para te proteger.
Mamãe sempre estará por perto, eu prometo. Estevão interveio, engolindo o dinheiro devido para não aumentar o da filha. Escute, meu amor, isso é para que você possa ter certeza. Confie, papai. Aos poucos, Mariapa foi conduzida até o carro oficial. Lúcia apareceu inesperadamente em frente à casa, notificada pela polícia. Ela correu para a garota e a abraçou com força. Você é muito corajosa, Mariapa. Eu ainda estarei aqui com você. O carro partiu, levando a garota embora. Rosa desabou em lágrimas no ombro do marido.
Rogelio, por sua vez, apenas riu de lado, murmurando palavras que só Estevão conseguia ouvir. Pura ação. Eles vão me agradecer de novo em breve. No abrigo temporário, Mariana passou por suas avaliações médicas iniciais. Os exames físicos mostraram sinais antigos e sutis, mas consistentes com abuso. Nada era conclusivo de sua autoria, mas a história, as histórias e como os sinais clínicos formavam um quadro cada vez mais sólido. Na avaliação psicológica, os especialistas notaram extrema ansiedade, dificuldade para dormir e sua resistência em pintar o mesmo quadro repetidamente.
Uma cama, uma porta aberta, uma sombra masculina. O relatório descrevia sinais claros de trauma e um medo específico direcionado ao avô. Com esses diagnósticos, o caso tomou outro rumo. O promotor compilou os relatórios e os encaminhou ao Ministério Público. A alegação, que antes parecia frágil, começou a se transformar em uma acusação formal. O avô exemplar estava cada vez mais exposto, e as paredes de silêncio e de segredo que o protegiam pareciam tão sólidas.
As notícias se espalharam pela escola em sussurros. Carmela, preocupada, ligou para Lúcia novamente. “Agora isso vai piorar de verdade. Eu disse que não queria que a imagem da escola se envolvesse nisso”, protestou ela, com a voz tensa. Lúcia respondeu sem hesitar. “A imagem não importa, a vida de uma garota importa.” E pela primeira vez, Carmela não obteve resposta. Naquele mesmo momento, Esteba recebeu a ligação oficial. O Ministério Público já estava considerando um processo criminal contra Rogelio.
A casa que antes parecia estar sustentada pelo poder do patriarca estava se tornando o cenário de seu colapso. E Maria, longe de tudo isso, finalmente dormia em segurança, embora o medo ainda a acompanhasse em sonhos que mal começavam a ser compreendidos por aqueles que realmente acreditavam nela. O tribunal estava lotado naquele momento. O caso, que já havia sido ouvido pelos corredores da cidade, estava se tornando um espetáculo público. Jornalistas lotavam o e-trace, vizinhos murmuravam nos bancos de trás e parentes distantes assistiam em silêncio confortável.
No centro, duas figuras dominavam a cena. Mariana, pequena e frágil, protegida por psicólogos e conselheiros, e Rogelio, altivo em uma roupa escura, como se ainda se acreditasse o pilar respeitado que fingia ser. O juiz abriu a audiência lendo a denúncia. A promotoria apresentou laudos médicos e psicológicos que indicavam que os sinais eram compatíveis com maus-tratos e abusos. O ar ficou sombrio e Rosa abaixou a cabeça. Capaz de encarar o olhar que a cercava, Lúcia foi a primeira a depor.
Ela sentou-se ereta, com as mãos entrelaçadas para esconder o tremor. Lembrou-se do dia em que Mariapa, no final da aula, a procurou, dizendo: “Meu avô fez de novo”. Lembrou-se de como a menina descreveu em detalhes como ele entrava em seu quarto à noite. Explicou a fuga desesperada da menina para a escola e as mensagens e ameaças que recebeu depois. Não conseguia ignorá-las. Pediu-me ajuda. A voz de Lúcia ressoou pela sala, firme apesar de sua emoção.
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