OS GÊMEOS MILIONÁRIOS NÃO COMIAM NADA, ATÉ QUE A NOVA BABÁ FEZ ALGO — E O PAI VIÚVO FOI…

Os filhos gêmeos do viúvo milionário não comiam nada, até que a nova babá fez algo inesperado e mudou suas vidas para sempre.

Ao sair do carro em frente à enorme mansão de Ricardo Navarro, Mariana sentiu uma pontada de nervosismo e excitação. Não era uma casa como qualquer outra, era uma casa cheia de silêncio.

Ao entrar, ela vê um longo corredor, quadros enormes, janelas altas que deixam entrar luz sem calor. Os funcionários mal respondem com um breve “olá”, como se tudo estivesse normal, mas ela sente que há algo estranho no ar. Nesse momento, Ricardo aparece, um homem alto, bem-vestido, com a testa ligeiramente franzida.

Ele não lhe oferece a mão, apenas diz “bom dia”, o que basta para entender que não está com vontade de conversar. Apresenta-a às crianças, Emiliano e Sofia, gêmeos de 8 anos. Aponta para elas sem emoção e diz que ela será sua babá. Ele as vê de perto, ele com o olhar vazio, ela de braços cruzados, ambos vestidos iguais, como se fossem espelhos. Mariana lhes dá um sorriso tímido e pergunta o que querem para o jantar. As crianças olham para ela e dão de ombros. A menina responde “nada”.

O menino repete a palavra “nada”. Mariana sente um aperto no coração, pois isso significa que seu trabalho não será como ela imaginava. Ricardo a observa e acena com a cabeça como se aprovasse algo, mas sem emoção. Mais tarde, ele os leva para um tour pela casa. Eles entram na sala de jantar e ela vê pratos finos, talheres e uma mesa enorme sem comida.

Em seguida, eles vão para a sala de estar, com poltronas aparentemente confortáveis, mas ninguém parece ficar sentado ali por muito tempo. No jardim, há brinquedos antigos e uma mesa redonda para refeições ao ar livre, que também não foi usada. As crianças passam sem nem olhar.

A farinha dos biscoitos que Mariana estava planejando há dois segundos está saindo da sua cabeça. Enquanto caminham, a babá escreve fotos nas prateleiras. Ricardo e sua esposa Lúcia juntos, sorrindo, abraçados. As crianças são como Lúcia, especialmente Sofia. Mariana sente um nó na garganta.

Quando terminam o passeio, Ricardo diz a ela para começar amanhã às 8 e a deixa sozinha com as crianças. Em silêncio, sozinha com elas pela primeira vez.

Ela fala com eles novamente em voz baixa. Pergunta como estão. Nada, só se ouve o eco da sua voz no corredor. Isso lhe confirma que não é só fome. Algo aconteceu em casa. Ela sai da sala e vê Ricardo sentado em seu escritório à distância. Ele não olha para ela, mas ela sente seu olhar. Ela abaixa a cabeça por um instante e continua seu caminho até a cozinha, pensando no que fazer para que aquelas crianças comam.

Lá fora, enquanto o sol se põe, sombras se espalham pela mansão. E Mariana se pergunta se aqueles fios de silêncio podem ser quebrados com ela. Ela fica por um momento olhando para um biscoito que alguém deixou sem terminar no balcão. Ela o coloca na boca e o prova, sem gosto, mas há uma centelha de cumplicidade no simples gesto. Feche os olhos.

Isso está apenas começando.

Mariana trocou de roupa rapidamente. Sem uniforme, sem aparência de enfermeira ou professora rigorosa. Escolheu uma calça jeans confortável e uma blusa leve. Prendeu o cabelo e desceu para a cozinha. Lá, conheceu Chayo, a cozinheira, uma mulher de cerca de 60 anos, séria, com voz grave.

Mariana se apresentou com um sorriso, mas Chayo mal levantou os olhos dos vegetais que estava cortando.

“Por que você se arruma tanto?” “Aqui as crianças nem te descascam e o homem menos ainda”, ele desabafou sem filtro.

Mariana apenas riu baixinho. Ele não gostou do tom, mas decidiu não se deixar levar. Quando Chayo terminou a refeição, Mariana perguntou o que as crianças tinham achado da comida.

“Eles gostavam de arroz com banana, mas isso era quando Lúcia era viva”, disse Chayo sem parar.

Mariana percebeu que “eles gostaram” como se não gostassem mais.

“E o que você comeu ontem?” ele perguntou.

“Nada.

Mariana permaneceu em silêncio. Chayo não parecia preocupado.

“É assim que eles são. Não comem. Desde que a mãe morreu, ninguém os obriga a comer. Cinco babás já faleceram. Todas foram embora.”

Mariana ficou curiosa, mas não queria parecer meticulosa. Ele foi até a mesa, limpou um pouco a área e começou a arrumar a louça. A sala de jantar era enorme, com um abajur pendurado que fazia mais sombra do que luz. Ele colocou guardanapos com figuras de animais que encontrou em uma gaveta.

Nada muito chamativo, apenas uma tentativa de tornar o momento mais agradável. Ricardo apareceu pontual, vestido como de manhã, elegante, mas sem alma. Cumprimentou-o secamente, sentou-se à frente da mesa e checou o celular.

Mariana arrumou os pratos e chamou as crianças. Elas desceram sem pressa, de mãos dadas. Sentaram-se uma de frente para a outra. Ninguém falou. Chayo serviu arroz, frango assado e sopa quente. O cheiro era bom, mas as crianças nem olharam.

Mariana sentou-se ao lado deles, observando cada gesto. Ricardo ergueu os olhos por um segundo.

” Eles podem comer se quiserem. Não são obrigados “, disse ele. Então, olhou para o telefone.

Mariana inclinou-se um pouco em direção a Sofia.

“Você quer que eu te ajude com o frango?”

A moça balançou a cabeça. Emiliano apenas olhou para o prato como se fosse uma folha em branco.

Mariana pensou nos sobrinhos, em como eles gostavam de fazer figuras com comida.

“E se fizermos uma careta com arroz?”, ele propôs em voz baixa.

Sofia revirou os olhos.

“Não queremos comer”, Emiliano deixou escapar sem emoção.

Ricardo olhou para cima, mas não disse nada. Mariana sorriu para o menino.

“Ok, você não tem nada para comer, mas pode me contar como foi seu dia.”

As crianças ficaram sem palavras. Chayo observava da cozinha com uma cara de “eu avisei”. Ricardo se levantou antes que 10 minutos se passassem.

“Tenho uma ligação. Com licença.”

Ele saiu sem mais delongas.

Mariana ficou sozinha com as crianças. O silêncio pesava, mas ele não desistiu. Parou. Era por uma maçã. Quebrou-a em gomos, dispôs-a em forma de estrela num pratinho e colocou-o entre os dois.

“Não é comida de verdade, é uma figura só para ver se você consegue adivinhar o que é.”

As crianças olharam para o prato. Um segundo. Dois. Sofia estendeu a mão e arrumou um pedaço. Emiliano fez outro movimento.

Eles não comeram, mas já tinham tocado em algo. Chayo estalou a língua.

“Isso não é jantar”, ele murmurou da cozinha.

Mariana ignorou o comentário. Ficou ali sentada, sem dizer mais nada, apenas observando as crianças, sem falar, arrumarem um pedaço de cada vez, formando uma espécie de flor. Quando terminaram, Sofia empurrou o prato para Mariana.

“É um sol”, disse ele. Emiliano assentiu.

Mariana sorriu. Não era comida, mas era um primeiro passo. Um sol feito de maçã numa casa onde tudo era frio. O jantar terminou com pratos cheios, mas pela primeira vez alguém falou, mesmo que fosse só um pouquinho.

Mariana limpou tudo, lavou a louça e, quando estava prestes a subir, Chayo se aproximou dela.

“Não se apegue, nada muda aqui.”

Mariana apenas olhou para ela.

“Veremos”, respondeu ele calmamente. E subiu lentamente as escadas, sabendo que o que estava por vir seria mais difícil do que imaginava.

A manhã começou com o som suave dos pássaros lá fora, mas na mansão nada podia ser ouvido, nem uma voz, nem uma risada, nem uma reclamação.

Mariana acordou cedo e foi direto para a cozinha. Chayo já estava lá, moendo café e cortando frutas com a mesma expressão antipática. Mariana lhe disse:

“Bom dia.”

Mas Chayo apenas levantou uma sobrancelha.

Mariana não se intimidou, preparou leite quente com um pouco de canela, torrou pão e colocou tudo numa bandeja.

Ela caminhou com firmeza até os quartos, bateu na porta do quarto dos gêmeos, esperou um segundo e entrou. Eles já estavam acordados, sentados na cama, assistindo TV com o volume baixo. Mariana colocou a bandeja em uma mesa baixa. “Não há regras hoje”, disse ela. Os dois se viraram para olhá-la. “Vamos fazer algo diferente.
” Ninguém respondeu, mas também não a ignoraram. Mariana fez um sinal com a mão para que a seguissem. Desceram as escadas em silêncio, passaram pela enorme sala de jantar e foram direto para a cozinha. Chayo os viu e soltou uma risada seca. Eles não podem estar aqui. Mariana olhou para ela calmamente. Hoje eles podem.
Chayo olhou para ela com os olhos arregalados. Isso é contra as regras do mestre. Mariana respirou fundo. “Então eu vou.” E continuou seu caminho, com as crianças a reboque. A cozinha era espaçosa, cheia de luz e com uma grande ilha no centro. Mariana tirou farinha, ovos, leite e açúcar. Ela colocou tudo na mesa como se fosse uma brincadeira. Emiliano se aproximou sem tocar em nada. Sofía a olhou com curiosidade.
Mariana entregou uma tigela para cada um. “Vamos fazer panquecas, mas vocês são os chefs. Eu só estou ajudando.” Eles se entreolharam, como se estivessem se perguntando se realmente conseguiriam. Sofía foi a primeira a colocar as mãos na farinha. Emiliano se atreveu a quebrar um ovo, embora o tenha feito com tanta força que respingou seu rosto. Mariana não riu; apenas lhe ofereceu um pano.
É o que acontece quando você tem pressa. Tudo bem. Aos poucos, eles se soltaram, riram baixinho, misturaram e provaram. A cozinha começou a se encher de um cheiro rico e diferente. Chayo os observava do fogão, de braços cruzados. Ele não disse nada, mas não foi embora. Quando terminaram de cozinhar, Mariana colocou as panquecas em pratinhos e as levou para a mesa da cozinha, não para a sala de jantar.
Ela sentou-se com eles, deu-lhes mel, fatias de banana e um pouco de chantilly. Sofía pareceu duvidosa. Emiliano girou o garfo na mão. Mariana não os olhou diretamente; apenas comeu o dela. Calmamente, como se tudo estivesse normal. Sofía foi a primeira. Ela pegou um pedacinho. Mariana fingiu não notar. Então Emiliano também. Eles não disseram nada, mas mastigaram.
Mariana quase caiu em prantos ali mesmo, mas conteve-se. Ela apenas disse: “Estava muito bom”. Eles não responderam, mas terminaram metade. Foi então que Ricardo entrou. Ele parou de repente quando viu a cena. Os três sentados na cozinha, pratos sujos, farinha na mesa, crianças comendo. Mariana olhou para ele sem se mexer.
“Bom dia”, disse ele. Sofía largou o garfo. Emiliano ficou parado. Ricardo se aproximou, sério. “O que você está fazendo aqui?” Mariana se levantou. “Estamos tomando café da manhã. As crianças cozinharam. Foi ideia minha.” Ricardo olhou para as crianças. Elas não falaram. “Vocês cozinharam?”, perguntou Emiliano. Ele assentiu. Sofía baixou o olhar. “Vocês comeram?” Desta vez, não disseram nada. Apenas Mariana respondeu.
Sim, pela primeira vez. Ricardo respirou fundo, olhou para a mesa e depois para Mariana. Isso não estava no plano. E daí se estava no plano?, perguntou ela baixinho. Chayo interveio do seu canto. Eles interferiram onde não deviam. Isto não é um restaurante. Ricardo olhou para ela. Tudo bem, Chayo. Deixe-nos só um momento. A mulher franziu os lábios e saiu.
Mariana não sabia se iam demiti-la ali mesmo. Ricardo olhou para os pratos. Depois para as crianças. “Você gostou?”, perguntou ele. Sofía fez um gesto quase imperceptível. Emiliano respondeu baixinho. “Sim.” Ricardo não sabia o que fazer com aquela resposta. Mariana também não. Ele ajeitou o paletó. “Tudo bem, mas não faça disso um hábito.” Ele saiu sem dizer mais nada.
Quando a porta se fechou, Mariana sentou-se novamente. Sofía lhe deu o garfo. “Podemos cozinhar de novo?” Mariana assentiu. “Quando você quiser.” A cozinha se encheu de barulho novamente. Pratos, risadas suaves e colheres tilintando. Não era uma refeição formal; era outra coisa, algo mais animado, algo mais real. A regra de ouro era simples: nada de forçar, apenas deixá-los decidir. Pela primeira vez, funcionou.
A rotina na casa não era mais a mesma, mesmo que ninguém dissesse isso em voz alta. Mariana percebeu isso assim que desceu as escadas. Os corredores não pareciam mais tão frios, e as crianças não se trancavam mais nos quartos o dia todo. Agora eles saíam, mesmo que fosse só para ver o que ela estava cozinhando ou para perguntar alguma bobagem, como se panquecas podiam ter formato de dinossauro.
Naquela manhã, Sofía apareceu na cozinha com o cabelo desgrenhado e um bicho de pelúcia na mão. Mariana estava lavando a louça. A menina não disse nada; apenas sentou-se no balcão e a olhou. Mariana lhe deu uma banana, assim mesmo, sem dizer nada. Sofía pegou e descascou-a com cuidado. Mariana mal podia acreditar. Não era grande coisa, mas era alguma coisa. Emiliano chegou dois minutos depois.
Hoje vamos cozinhar. Ariana secou as mãos e se virou. “Se você quiser.” Ele assentiu e sentou-se ao lado da irmã. Ambos estavam em silêncio, mas ali, juntos, estavam presentes. Ricardo os observava da porta sem entrar. Ele os observou apenas por alguns segundos antes de continuar seu caminho, mas Mariana percebeu.
Ele passava pelas crianças com mais frequência, sempre com desculpas — que tinha esquecido alguma coisa, que estava procurando um pedaço de papel —, mas Mariana sabia que não. Ele estava observando. Ela ainda não sabia o que fazer, mas deixou que ele fizesse. Naquele mesmo dia, Mariana os levou para o quintal. Era a primeira vez. Viu? Ela abriu o portão com uma chave que encontrou em uma das gavetas da cozinha.
Era um quintal grande, com árvores altas e uma fonte seca. Havia brinquedos velhos em um canto, alguns enferrujados, mas a grama estava verde. As crianças hesitaram em sair. Sofía ficou na porta. Emiliano olhou para ela como se pedisse permissão. Mariana continuou andando sem se virar, como se fosse a coisa mais normal a se fazer. Quando chegou ao centro do jardim, ouviu-os correndo atrás dela.
Brincavam com uma bola murcha que encontraram em alguns arbustos. Mariana lhes ensinou uma brincadeira de infância: jogar a bola para o alto e pegá-la sem deixá-la cair. Sofía ria cada vez que errava. Emiliano a imitou. Mariana deixou que ganhassem. Fazia tanto tempo que não riam que ela sentiu que o ar do lugar havia mudado.
À tarde, Mariana os levou para a sala de brinquedos, que estava fechada há muito tempo. Ricardo a trancara porque, segundo ele, trazia lembranças dolorosas. Mas Mariana encontrou a chave em uma caixa de ferramentas. Entraram devagar. A poeira cobria quase tudo. Havia bonecas, livros, uma casa de madeira em miniatura e um tapete com caminhos pintados.
As crianças não disseram nada; apenas olhavam para tudo com um misto de surpresa e tristeza. Mariana sacudiu o tapete vigorosamente, abriu as janelas e deixou a luz entrar. Este quarto é seu. Vocês podem fazer o que quiserem aqui. Emiliano foi até uma estante e pegou um livro. Sofía sentou-se em um canto e abraçou uma boneca velha.
Eles não falaram, mas seus corpos falavam muito. Na hora do jantar, Mariana deixou que escolhessem o cardápio. “Hoje é o dia de vocês”, disse ela. Sofía pediu quesadillas e Emiliano queria arroz com banana-da-terra. Mariana pôs mãos à obra. Chayo observava de longe, de braços cruzados. “Nunca vi essas crianças pedirem comida”, murmurou. Mariana sorriu para ele. Eu também não.
Quando se sentaram para comer, os pratos não estavam vazios, mas pelo menos a comida não ficou intocada. Era como se, aos poucos, o gelo começasse a derreter. Naquela noite, Mariana ficou um pouco mais depois da hora de dormir, lendo uma história para eles enquanto se acomodavam sob os lençóis.
Quando ela terminou, eles não disseram nada, mas também não pediram que ela fosse embora. Ela permaneceu em silêncio por mais um tempo. Sofía se virou para a parede. Emiliano estava deitado de costas, olhando para o teto. Mariana acariciou os cabelos deles com muita delicadeza. Ninguém se mexeu. Quando ela saiu do quarto, Ricardo a esperava no corredor.
As mãos dele estavam nos bolsos, o rosto tenso. Mariana olhou para ele, sem saber se ele estava irritado ou curioso. Ele quebrou o silêncio. “O que você fez com eles?” Mariana franziu a testa. “Nada, eu só estava com eles.” Ricardo assentiu lentamente. Fazia muito tempo que ela não os via. Então Mariana queria dizer mais alguma coisa, mas não disse. Ela apenas olhou em seus olhos.
Ele baixou o olhar como se se sentisse culpado. Cada passo que davam era pequeno, mas real, e isso começava a ser sentido em cada canto daquela casa, que finalmente parecia menos uma casa e mais um lar, mesmo que ninguém o expressasse com palavras. O céu estava parcialmente nublado, mas o tempo estava perfeito para estar ao ar livre. Não estava quente, nem frio.
Mariana desceu com as crianças depois do almoço. Emiliano carregava uma bola debaixo do braço e Sofía carregava um caderno no qual desenhava rostos tristes com olhos grandes. Mariana não disse nada sobre isso; Ela simplesmente abriu o portão do jardim sem perguntar a ninguém. Chayo olhou para ela da janela novamente com um olhar que dizia: “Você vai se meter em encrenca”, mas não disse nada.
Os três saíram para o jardim. Havia uma mesa comprida com bancos de madeira em um canto. Mariana se aproximou, limpou-a com um pano e colocou alguns sucos que havia preparado em potes com canudos. “Hoje vamos fazer algo diferente”, disse ela. Emiliano deixou a bola na grama e se aproximou. Sofía sentou-se sem largar o caderno.
Mariana tirou uma caixa de papelão. Continha tesouras de ponta redonda, giz de cera, fita adesiva, botões velhos, lã, folhas secas e um monte de outras coisas. “Vamos inventar alguma coisa. Um monstro, um robô, um animal estranho, o que vier à mente.” Sofía olhou para cima pela primeira vez no dia. Emiliano tirou alguns botões. “Isso é lixo”, perguntou ele. Mariana riu. “
Sim, mas coisas boas vêm do lixo.” Eles passaram mais de uma hora lá. Mariana fez um pássaro com tubos de papelão, Sofia um cachorro com tampinhas de garrafa e Emiliano um robô com latas. Ninguém falava muito, mas o ambiente era descontraído, até alegre. De vez em quando, ouviam-se risadas suaves. Mariana gostava desses momentos, espontâneos, naturais, daqueles que acontecem quando ninguém finge. Ricardo os observava da janela do escritório.
Fechou o computador sem perceber. Observou Emiliano exibir seu robô como se fosse um troféu. Mariana o aplaudiu como se fosse uma verdadeira obra de arte. Sofia lhe mostrou seu desenho, e Mariana a abraçou sem fazer alarde. Apenas a abraçou como quem sabe o quanto aquele momento vale.
Ricardo passou a mão pelo rosto. Algo lhe coçava o peito. Mais tarde, Mariana trouxe uma bandeja de biscoitos que fizera com as crianças no dia anterior. Perguntou se queriam um. Emiliano pegou dois. Sofía só um, mas comeu tudo. Mariana fingiu não estar animada, apenas lhes deu um copo de leite e continuou o jogo. Depois, jogaram futebol. Mariana era a goleira.
Sofía gritava cada vez que Emiliano marcava. Mariana se jogou na grama artificial. Fingiu que não conseguia se levantar. As crianças riram. A bola rolou pela grama. Ricardo olhou pela janela novamente. Essa expressão não desapareceu; ele ficou ali encostado no batente, com os braços cruzados, sem dizer nada. Quando começou a escurecer, Mariana limpou tudo com a ajuda das crianças. Ela não pediu.
Fizeram tudo sozinhos. Guardaram os utensílios, levaram os copos para a cozinha e lavaram as mãos. Chayo não interferiu, mas os observou com o canto do olho. O rosto de Minones parecia estranho, como se ele não soubesse se ela estava chateada ou surpresa. Uma vez na sala, Mariana os deixou assistir a um episódio de desenho animado. Sentaram-se no chão com almofadas. Emiliano adormeceu.
Sofía encostou-se a Mariana sem dizer uma palavra. Quando Ricardo entrou e os viu assim, ficou em silêncio. Mariana fez sinal para ele ficar quieto. Ele apenas assentiu. Mariana caminhou com ele para o corredor. Ricardo não a olhou nos olhos, apenas disse: “Obrigado”. Mariana baixou o olhar. “Eu não fiz nada de especial.” Ricardo respirou fundo. “Você fez muita coisa.
Não sei como, mas fez.” Ficaram em silêncio por um segundo. Mariana quebrou o momento. “Amanhã quero levá-lo ao mercado. Quero que você escolha sua comida.” Ricardo hesitou. “Ao mercado com pessoas.” Mariana assentiu. “Vivo.” Ricardo não disse sim nem não; ele apenas foi embora. Naquela noite, as crianças dormiram sem pedir histórias.
Mariana cobriu-os, beijou-os na testa e saiu do quarto sem reclamar de cansaço. Lá fora, o céu estava limpo. Havia lua. O tipo de noite que parece diferente, mesmo quando nada acontece, mesmo quando tudo continua igual. Mas algo se moveu lá dentro, e isso bastava para dizer que era uma tarde diferente. A casa tinha lugares onde ninguém entrava. Mariana já tinha notado.
Havia portas trancadas, cortinas que nunca eram fechadas e quartos que nem as crianças mencionavam. Certa tarde, enquanto os gêmeos tiravam uma longa soneca depois de correrem pelo jardim, Mariana aproveitou para se arrumar um pouco sozinha. Subiu ao segundo andar e começou a verificar um corredor por onde nunca tinha passado.
Lá, encontrou uma porta diferente das outras. Era de madeira mais escura, com uma fechadura antiga e uma plaquinha quase invisível. Dizia “Escritório”. A porta não estava trancada. Só estava trancada por dentro. Mariana empurrou com cuidado, abriu devagar. Lá dentro, cheirava a algo guardado há anos. Não tinha apodrecido, mas cheirava como se o tempo tivesse parado.
Era uma sala de tamanho médio, com uma escrivaninha cheia de papéis, uma cadeira giratória, fotos emolduradas e um cabideiro com um suéter pendurado. Tudo estava em seu lugar, como se alguém ainda o usasse. Nas paredes, havia desenhos feitos por crianças, alguns assinados a giz de cera. Para a mãe, com carinho. Mariana sentiu um aperto no estômago.
Lucía estava lá, não em corpo, mas em cada coisa. Havia fotos dela com os gêmeos quando bebês na praia, no jardim da casa. Lucía sorria em todas elas; parecia viva, parecia feliz. Mariana não pôde deixar de se aproximar. Ela tocou cuidadosamente em um porta-retrato, como se movê-lo pudesse perturbar algo importante. Sobre a mesa havia um caderno.
Não era um diário, mas continha anotações manuscritas. Receitas, listas de tarefas, anotações sobre as crianças. Mariana folheou as páginas cuidadosamente. Uma delas dizia: “Emiliano odeia ovos, mas adora pão com canela. Sofía prefere ficar quieta, mas desenha tudo o que sente”. Mariana leu várias vezes.
Era como se Lucía ainda estivesse lá, guiando-a a milhares de quilômetros de distância. Ela não sabia há quanto tempo estava no quarto quando ouviu passos no corredor. Rapidamente fechou o caderno e deu um passo para trás. A porta se abriu de repente. Era Ricardo. Seus olhos estavam duros, sua boca apertada. “O que você está fazendo aqui?”, disse ele sem gritar, mas com uma voz que doía. Mariana engoliu em seco. Ele estava limpando.
A porta não estava trancada, ele só queria trancar. Ricardo levantou a mão. “Não toque neste quarto.” Mariana queria explicar, mas ele já havia entrado. Ela se aproximou da escrivaninha, pegou o caderno e o guardou em uma gaveta. Depois, trancou-a. Você não entra aqui. Ponto final.
Mariana não disse nada; apenas saiu do quarto, com o rosto corado, desceu as escadas rapidamente e foi para a cozinha. Chayo estava lá, picando cebolas. “O que você fez agora?”, perguntou ele num tom entre deboche e irritação. Mariana não respondeu. Apenas se serviu de um copo d’água. Chayo a olhou com o canto do olho. “Você entrou no escritório, não foi?” Mariana assentiu sem dizer nada. Chayo suspirou. “
Ninguém entrou lá desde que Lucía morreu, nem ele ousa tocar em nada, mas parece que você está tirando tudo o que ele guardava lá dentro.” Mariana não sabia se aquilo era uma repreensão ou uma observação. Deixou o copo sobre a mesa e sentou-se. Sua cabeça girava. Lucía não estava viva, mas se sentia presente em cada canto, e aquela presença não deixava espaço para mais ninguém.
Ricardo ainda estava preso a ela, isso era claro, mas também era claro que as crianças estavam começando a se soltar, e ele não parecia saber o que fazer com essa mudança. Naquela noite, Mariana se aproximou dos gêmeos enquanto eles montavam um quebra-cabeça. Ela perguntou sobre a mãe deles. Sofía olhou para baixo. Emiliano respondeu: “Ela estava cantando enquanto cozinhava”. Mariana sorriu.
O que ela estava cantando? Uma canção antiga, aquela sobre os elefantes balançando. Mariana começou a cantá-la suavemente. Sofía olhou para ela. “Você sabia?” Mariana balançou a cabeça. “Mas eu posso aprender.” Eles cantaram por um tempo. Então ela os colocou na cama, beijou-os na testa e, quando saiu do quarto, ficou do lado de fora por um momento. O corredor estava escuro.
Ao fundo, a porta fechada do escritório podia ser vista. Mariana sabia que não deveria voltar para dentro, mas também sabia que aquele quarto não estava cheio apenas de memórias, estava cheio de segredos. E, mais cedo ou mais tarde, esses segredos viriam à tona, porque Lucía não estava mais lá, mas sua sombra ainda reinava. Naquela manhã, Mariana desceu com as crianças depois do café da manhã.
Estavam felizes, rindo de algo que Emiliano havia dito sobre um gato com quem sonhara. Mariana segurava as mãos delas, uma de cada lado. A cozinha cheirava a pão fresco, e Chayo estava de melhor humor do que de costume. Ela até deixara o rádio ligado baixinho. Tudo parecia estar indo bem até que uma voz familiar, alta e autoritária se fez ouvir no corredor.
“E esta cena feliz”, disse uma mulher magra, de cabelos castanhos, muito arrumada para tão cedo. Usava salto alto, bolsa de grife e óculos que tirou elegantemente. Mariana não a conhecia, mas, a julgar pela postura das crianças, sabia que era alguém importante. Ricardo apareceu logo atrás dela.
“Adriana, você chegou cedo”, disse ele com um sorriso que não parecia muito sincero. Adriana, tia e irmã de Lucía, já tinha ouvido falar dela, mas não a tinha visto pessoalmente. Sofía soltou a mão de Mariana e se escondeu um pouco atrás do pai. Emiliano permaneceu imóvel. Mariana sentiu o ar frio sem motivo. Adriana caminhou com passos firmes em direção às crianças. Beijou as duas na testa, mas elas não reagiram.
Então, olhou Mariana de cima a baixo. “E você é a nova babá.” Mariana assentiu. “Prazer em conhecê-la, eu sou Mariana.” Adriana não retribuiu o cumprimento; apenas sorriu sem entusiasmo. “Ricardo, podemos conversar em particular?” Ele hesitou por um segundo. “Claro. Venha comigo para o escritório.”
Antes de sair, Ricardo fez um gesto para Mariana como se dissesse: “Calma”. Mas ela sentiu que ele não estava. Assim que a porta do escritório se fechou, Chayo se aproximou. “A tempestade chegou”, disse ele suavemente. Mariana não entendeu. “Por que você está dizendo isso?” Chayo fez uma careta. “A Adriana quer cuidar desta casa. Ela sempre cuidou dela, e não vai gostar do que você está fazendo com as crianças.”
Mariana engoliu em seco. Estava apenas fazendo seu trabalho, nada mais. Mas Chayo tinha razão. Adriana não parecia confortável com ela ali. Naquele mesmo dia, Adriana saiu do escritório novamente com Ricardo. Ela ficou em casa o dia todo, vagando por ali como se fosse dona. Mariana a viu entrar na sala de brinquedos, folhear livros de histórias ou ler as roupas das crianças.
Na hora do almoço, ela se sentava à cabeceira da mesa. Ricardo de um lado, as crianças na frente dela, Mariana na outra ponta. “Disseram-me que agora você cozinha”, disse Adriana, olhando para o guardanapo. “Sim”, respondeu Mariana calmamente. “Você gosta?” Adriana riu. “Sim, claro.
Crianças ricas sempre gostam de brincar de pobres por um tempo.” Ricardo olhou para ela, irritado. Mariana respirou fundo. Ela não ia se viciar. Depois do almoço, Sofía queria desenhar, mas Adriana disse que precisava trocar de roupa porque estava toda bagunçada. Emiliano queria brincar no jardim, mas ela disse que ele podia ficar doente por causa da umidade.
Mariana não disse nada, mas as crianças a olharam com expressões de “E agora?”. Mais tarde, Mariana foi procurar Ricardo. Encontrou-o no escritório. Ele abriu a porta, com ar cansado. “Está tudo bem?”, perguntou ela. Ricardo assentiu. Adriana só vem para se certificar de que está tudo normal. Mariana olhou para ele. Mas as coisas não estão mais normais; estão melhores. Ricardo olhou para baixo.
É isso que a incomoda. Naquela noite, depois que Adriana foi embora, Ricardo desceu até o quintal onde Mariana estava recolhendo brinquedos. Ele a ajudou sem dizer nada por alguns minutos. Então, sem olhá-la nos olhos, disse: “Ela acha que você está ocupando um lugar que não é seu.” Mariana parou. “E o que você acha?” Ricardo olhou para cima.
“Não sei, mas as crianças precisam de você, e isso pesa mais do que qualquer opinião.” Foi a primeira vez que Mariana sentiu que algo estava mudando entre eles. Não era apenas respeito; Havia algo mais, algo que Adriana não ia gostar. E ela sabia disso porque o ciúme não era mais só das crianças; era de tudo o que Mariana estava começando a agitar naquela casa. Aquele sábado amanheceu com uma espécie de resolução que convida a sair.
Mariana acordou as crianças mais cedo do que de costume. Vestiu-as com roupas confortáveis, tênis e preparou uma mochila com água, frutas e biscoitos. Emiliano perguntou para onde iam. Mariana apenas sorriu. Para um lugar que não conheciam bem. Sofía arqueou uma sobrancelha, mas não disse nada. Desceram as escadas em silêncio. Ricardo não estava.
Segundo Chayo, ele havia saído para uma reunião cedo. Isso deu espaço para Mariana se movimentar. Ela caminhou com as crianças pelo longo corredor que levava aos fundos do jardim. Havia um portão ali, sempre trancado. Mariana vira aquele portão desde o primeiro dia, mas nunca ousara perguntar. Até que uma tarde, Emiliano lhe disse em voz baixa que havia algo divertido lá atrás, que sua mãe
costumava deixá-los brincar lá antes de tudo. O portão estava enferrujado. Mariana enfiou a mão no bolso e tirou uma chave pequena e velha que encontrara em uma gaveta do galpão de ferramentas. Serviu perfeitamente. O clique da fechadura foi suave, mas em sua cabeça soou como se ela estivesse quebrando uma grande regra. Ela a abriu lentamente. Sofía se apertou contra o corpo. Emiliano entrou primeiro. O espaço era um segundo jardim escondido, mais
selvagem, com grama alta, árvores tortas, uma casinha de madeira meio quebrada, uma corda pendurada em um galho e um balanço velho, tudo coberto de folhas secas. Mas havia algo especial no ar, como se algo de bom tivesse acontecido ali há muito tempo. “Que lugar é este?”, perguntou Sofia baixinho. Mariana agachou-se à sua frente. “É o lugar dela.”
Você o conhecia melhor do que ninguém. Emiliano começou a correr. Sofia ficou parada por alguns segundos e depois a seguiu. Mariana os observou brincar. Não houve gritos altos, mas houve risadas. Risadas de verdade. O balanço rangeu, mas aguentou. Emiliano subiu primeiro. Sofia empurrou por trás. Mariana encontrou um banco velho e sentou-se lá. Ela pegou os sucos e os colocou sobre uma toalha.
Parecia um piquenique dentro de uma casa gigante. As crianças descobriram uma caixa enterrada e a desenterraram com as mãos. Estava cheia de brinquedos encharcados pelo tempo, mas entre eles havia fotos, pedras pintadas e cartões com desenhos. Sofia encontrou um que dizia Clube secreto de Sofia e Emy. Mariana sentiu um aperto no peito.
“Podemos reconstruir a casinha?”, perguntou Emiliano. “Claro que podemos”, respondeu Mariana sem pensar. Horas se passaram entre galhos, pedras, folhas secas e gritos baixos de excitação. Sofia encontrou uma boneca quebrada e a colocou em um canto da casinha. Emiliano colocou uma pedra grande como assento.
Mariana consertou o telhado com uma lona velha que carregava na mochila. Não estava perfeito, mas eles não se molhariam se chovesse. No meio de tudo isso, ouviram passos, passos firmes. Ricardo parou de repente ao ver o portão aberto. Caminhou rapidamente, com o rosto sério. Mariana o viu chegando, mas não se mexeu. As crianças também não. Ricardo olhou tudo em silêncio:
o balanço, a casinha de brinquedo, os restos do piquenique. Então ele falou baixinho. “Quem te deu permissão para entrar aqui?” Emiliano olhou para ele com medo. Sofia abaixou a cabeça. Mariana se levantou. “Eu te trouxe aqui. Este lugar te pertence, e você precisava voltar.” Ricardo apertou os lábios, virou-se e olhou para a grande árvore. Havia uma tábua com os nomes das crianças esculpida.
Lucía tinha feito aquele lugar para elas. Ele falou quase sem voz. Era o canto secreto delas. Mariana não sabia se falava ou se ficava em silêncio. “E por que você fechou?”, perguntou ela finalmente. Ricardo demorou a responder porque me doía, porque eu não conseguia vê-lo sem pensar nela. Mariana olhou diretamente para ele, e eles também não poderiam esquecê-la se estivessem proibidos de se lembrar dela.
Ricardo ficou parado, então se aproximou da árvore, passou a mão na tábua e sentou-se no chão. Emiliano se aproximou dela. “Papai, podemos vir aqui todos os dias?” Ricardo não respondeu imediatamente, então olhou para ele. — Sim, mas só se você cuidar do lugar. — Sofía se aproximou dele e colocou o cartão secreto do clube em seu colo.
Ricardo olhou para ele, deu um leve sorriso e o guardou no casaco. Naquela tarde, ninguém mencionou a palavra “proibido”, ninguém fechou o portão. Ninguém fingiu que nada havia acontecido, porque aquele lugar cheio de poeira e galhos havia trazido algo que não se sentia há muito tempo: a liberdade. Naquele dia, Mariana decidiu que não iria cozinhar sozinha, não porque estivesse cansada, mas porque já sentia que cozinhar com as crianças não era uma atividade, mas um ponto de conexão. O que começou no dia 19, a cozinha ficou com eles pelo resto do ano.
E naquele dia ela teve uma ideia diferente. De manhã, foi ao mercado, sem pedir permissão. Disse a Chayo que levaria as crianças, ponto final. Ricardo não estava lá. Adriana também não. Chayo bufou, mas não a impediu. Mariana caminhou com os gêmeos pelos corredores do mercado de San Ángel. Ela os deixou tocar, cheirar e provar as coisas.
Eles compraram espigas de milho, pão doce, morangos frescos, queijo Oaxaca e carne para enchiladas. Emiliano escolheu as tortilhas. Sofía encontrou um pequeno buquê de flores que queria levar para embelezar a sala de jantar. Quando voltaram, Mariana os deixou ajudar com tudo. Sofía lavou os morangos com tanto cuidado como se fossem joias.
Emiliano ralou queijo e acabou com os dedos pegajosos. Mariana cozinhou e cantou uma antiga cumbia que sua mãe tocava em casa. As crianças não sabiam a letra, mas riram quando ouviram. Por volta das 7, Mariana pôs a mesa, mas não na cozinha como de costume. Desta vez foi na grande sala de jantar, aquela que ninguém usava. Ela removeu as toalhas de mesa velhas e colocou os jogos americanos que as crianças haviam decorado com canetinhas e guardanapos coloridos.
No meio estava o pequeno buquê de flores que Sofía trouxera. A iluminação era fraca, o cheiro de comida quente subia. Ricardo apareceu no momento em que ela acendeu a última vela. Ele parou ao ver tudo isso. Mariana olhou para ele. “Você vai ficar para o jantar?” Ele franziu a testa como se a pergunta fosse estranha. “Aqui. Sim, conosco.” Ricardo hesitou.
Então viu Emiliano sair com a jarra de água, Sofía arrumando os garfos, e assentiu. Os quatro se sentaram. Mariana serviu as enchiladas e explicou o que tinham feito. Eles tinham escolhido tudo isso. Bem, exceto a cumbia. Sofía riu. Ricardo deu a primeira mordida e permaneceu em silêncio. Mariana achou que ele não tinha gostado, mas ele engoliu lentamente e disse: “Está muito bom.
” Emiliano abriu os olhos. Sério. “Sim.” “Muito bom.” Sofía acrescentou mais queijo à sua enchilada. O jantar continuou sem tensão. Ricardo fez perguntas simples. Como teria sido o mercado que compraram se tivessem barganhado? Mariana notou que ele não falava como um chefe; falava como o papai, como um homem normal.
A certa altura, Emiliano disse: “Pai, você se lembra de quando a mamãe fazia sopa de letrinhas?” Ricardo largou o garfo e sorriu, mas aquele sorriso era meio doce, meio triste. Sim, ele gostava de esconder palavras. Ele sempre escrevia “Eu te amo” em letras, dizia Sofía. Mariana não disse nada; apenas ouviu. Depois da refeição, eles não se levantaram imediatamente. Sofía queria que todos jogassem uma brincadeira. “Você prefere?” Com perguntas bobas.
“Você prefere um nariz de palhaço ou pés de pato?” Ricardo riu. Pés de pato. Nada melhor. Mariana nunca o tinha visto rir daquele jeito. Não era uma risada, mas um som genuíno e limpo, de alguém que havia se esquecido de como rir há muito tempo. Quando a brincadeira acabou, Mariana começou a tirar os pratos, mas Ricardo a interrompeu. “Deixa pra lá, eu ajudo.” Mariana olhou para ele surpresa.
Ele já estava levando os copos para a cozinha. Sofia aplaudiu como se fosse um feito. Papai lavava a louça. Emiliano o aplaudiu. Ricardo, rindo, disse simplesmente: “Hoje está tudo diferente, não é?” E sim, estava, porque aquele jantar não tinha sido planejado.
Não era um jantar elegante nem um evento especial; era apenas isso: um jantar, uma mesa, comida feita com amor, palavras simples, mas para aquela casa, era como uma festa. Mariana observou Ricardo secar um copo com um pano, Sofia arrumar os guardanapos, Emiliano fechar a mesa para o jantar sem que ninguém pedisse, e pensou que aquele momento, por mais simples que fosse, era exatamente o que aquela família precisava para começar a se sentir assim.
Família, tudo começou num domingo, um daqueles dias tranquilos em que ninguém tem pressa para nada. Ricardo tinha ido correr cedo. As crianças estavam ocupadas na sala de brinquedos tentando construir um forte com almofadas. Mariana, por sua vez, decidiu organizar uma prateleira velha no corredor do segundo andar. Não por obrigação, ela fez isso porque tinha o hábito de arrumar o que os outros tinham esquecido.
Tirou livros empoeirados, papéis soltos e fotos sem moldura. Atrás de uma pilha de revistas, encontrou uma caixa de papelão amarrada frouxamente com uma fita azul. Não tinha nome nem etiqueta. Estava escondida entre uma enciclopédia quebrada e um vaso rachado. A caixa não pesava muito. Mariana a levou até a lavanderia, colocou-a sobre a mesa e a abriu.
Dentro havia coisas simples: cartões de aniversário, um desenho infantil, uma bolsinha com botões e, no fundo, um caderno espiral. A capa estava delineada com caneta preta. Lucía, só minha. Mariana a segurava com as duas mãos. Seu instinto lhe dizia para fechá-lo, mas algo mais forte lhe dizia para lê-lo. Ela abriu a primeira página.
A caligrafia era bonita, com letras redondas e limpas. Lucía escrevia como falava, dava para ver. Nada ornamentado, tudo direto. O primeiro parágrafo dizia algo superficial, vomitando seu primeiro pedaço de papinha. Depois, ela falou sobre Emiliano e seu hábito de esconder coisas nos sapatos. Mariana virou as páginas. O que ela segurava não era um diário comum; era mais uma espécie de válvula de escape, um espaço onde Lucía anotava o que não conseguia dizer em voz alta.
Havia bilhetes sobre Ricardo, alguns doces, outros nem tanto. Um dizia: “Às vezes sinto que Ricardo está aqui, mas não está. Ele olha para as crianças, mas pensa no trabalho ou nela.” Mariana não entendia a quem ela se referia com “ela”. Haveria outra pessoa? Mais tarde, ela encontrou algo que a fez parar.
Uma página arrancada, mas com o suficiente para ler. Um pedaço. Adriana voltou. Ela diz que não quer nos separar, mas seu olhar me perfura. Sinto como se ela não tivesse largado Ricardo, mesmo que ele jure que é imaginação minha. Mariana fechou o caderno por um instante e olhou para a porta. Ninguém o abriu novamente. Começou a ler com mais detalhes.
Lucía contava momentos felizes com as crianças, receitas que queria experimentar, frases que não queria esquecer, mas também havia muito cansaço em suas palavras, esgotamento emocional. Dúvidas. Uma linha dizia: “Meu corpo dói, mas minha cabeça dói mais de pensar em tudo que calo”. E então, quase no final, encontrou outra frase-chave.
Se algo me acontecer, espero que alguém entenda o que eu não consegui dizer em voz alta. Mariana fechou o diário com força. Seu coração batia mais rápido. Não era fofoca, não era curiosidade mórbida. Era como se Lucía estivesse falando com ela de outro lugar, contando algo que ninguém mais queria ver. Mariana guardou o diário imaesitero na mochila.
Decidiu não dizer nada por enquanto, nem para Ricardo, nem para Chayo, nem para ninguém. Naquela noite, não conseguiu dormir bem. As palavras de Lucía lhe pareceram suas. Começou a ver Adriana com outros olhos. Cada sorriso dela parecia forçado, cada comentário, um disfarce. E o pior era que Ricardo parecia não notar, ou não queria.
Na manhã seguinte, Sofía encontrou Mariana na cozinha e disse que queria manter um diário como o da mãe. “Como você sabe que ela tinha um?”, perguntou Mariana. “Uma vez ela me disse que, quando estava triste, escrevia e se sentia menos sozinha.” Mariana engoliu em seco, deu-lhe um caderno novo e disse-lhe para fazer o mesmo. Sofía sorriu. “Mas eu não quero escrever coisas tristes.
Quero dizer o que gosto em você.” Mariana não sabia o que dizer; apenas a abraçou. Mas ela não era mais a mesma. Algo havia mudado. Agora ela sabia que Lucía não havia morrido em paz e que talvez sua morte deixasse mais perguntas do que respostas. O diário não dizia tudo, mas dizia uma coisa muito claramente.
Lucía não confiava em todos ao seu redor, e Mariana agora começava a entender o porquê. Desde que Mariana leu o diário de Lucía, algo dentro dela não a deixava em paz. Ela andava pela casa com o mesmo sorriso. Cozinhava, brincava com as crianças. Ouvia Chayo falar sobre seus males, mas por dentro não conseguia parar de pensar no que havia lido, especialmente naquela parte dela, naquela mulher que ela olhava, nomeada sem nome, que parecia estar sempre por perto, mesmo que ninguém falasse dela.
Não demorou muito para que Adriana reaparecesse. Desta vez, ela chegou com malas. “Só vou ficar aqui alguns dias”, disse ela com sua voz seca típica. Ricardo não protestou; parecia cansado, distraído. Mariana não se surpreendeu. O que a surpreendeu foi a mudança nas crianças. Assim que viram Mina Nesenta, a tia ficou séria.
Sofía parou de falar com Mariana por um tempo. Emiliano ficou mais quieto. Era como se a presença de Adriana os fizesse encolher. Adriana se acomodou em um dos quartos de hóspedes, mas não ficou parada. Andava de um lado para o outro como se inspecionasse tudo. Comentava coisas sem que lhe pedissem. “Esta toalha está manchada.”
“Crianças não deveriam poder correr pela casa. Não entendo como Mariana tem tanto acesso a tudo.” Ninguém lhe respondeu, mas o ambiente já não era o mesmo. Uma tarde, Mariana estava na biblioteca com as crianças. Lia uma história para elas quando ouviu alguém falando ao telefone no corredor. Era Adriana. Seu tom de voz não era o habitual. Estava chateada. Não, não posso forçar. Ainda não.
É estranho. Mais perto dela. Sim, a babá. Eu disse que não era qualquer uma. Mariana congelou. Não era do seu feitio ouvir conversas, mas aquela voz baixa e nervosa a fez ficar ali, imóvel. Lucía descobriu. Claro que descobriu, disse Adriana do outro lado da porta. Foi por isso que tudo foi para o inferno. Foi por isso que ela começou a escrever coisas.
Não se preocupe, ninguém vai ler isso. Mariana levou a mão ao peito. O diário. Era isso que Adriana queria esconder? Ela fechou o livro de histórias, beijou as crianças e saiu com uma desculpa. Quando chegou ao corredor, Adriana tinha sumido; tudo o que restava era aquele silêncio desconfiado que alguém deixa quando acaba de esconder algo.
Naquela noite, Mariana não conseguia se livrar da dúvida. Procurou Chayo na cozinha. Serviu o chá e sentou-se à sua frente. “Você sabia se Lucía suspeitava de Adriana?” Chayo olhou para ela como se ela tivesse lhe feito a pergunta mais perigosa do mundo. Ele não respondeu imediatamente. “Você? Por que está perguntando isso?” Mariana deu de ombros. “É só uma dúvida.” Chayo baixou a voz.
“Olha, eu não vou colocar a mão no fogo por ninguém.” Mas Lucía era esperta. Ela via coisas que os outros não viam. Mariana se aproximou um pouco mais. Coisas como Chayo olhando para ela faziam parecer que Adriana não estava vindo apenas para ver as crianças. Ela veio por Ricardo. Mariana não precisava de mais nada. Com o estômago embrulhado, ela começou a juntar as peças: as visitas constantes, o desconforto de Lucía no diário, as frases interrompidas, tudo apontava para a mesma coisa.
Ricardo e Adriana tiveram algo em algum momento, talvez antes de Lucía, talvez durante, e Lucía sabia disso. No dia seguinte, Mariana foi com Ricardo, encontrou-o no jardim lendo alguns jornais e sentou-se ao lado dele sem rodeios. Você e Adriana tiveram algo. Ricardo a olhou fixamente. O quê? Não minta para mim, apenas me diga a verdade. Ele fechou os jornais.
Foi antes de Lucía, muito antes. Éramos jovens. Aconteceu uma vez. Não foi sério, mas Adriana nunca deixou para lá completamente. Mariana o encarou. Lucía sabia. Ricardo baixou o olhar. Sim. E doeu muito. Mariana engoliu em seco. Ela não sabia se sentia raiva ou compaixão. “E por que você a deixou ficar em casa?” Ricardo esfregou o rosto.
“Por que ela é tia das crianças? Porque me sinto culpada. Porque não quero mais problemas.” Mariana se levantou. “Bem, os problemas já estão aqui, e estão disfarçados de família.” Naquela noite, Mariana olhou novamente o diário. Releu aquela frase. “Se algo me acontecer, espero que alguém entenda o que eu não consegui dizer em voz alta.” Agora ela entendia.
Não se verifica, mas com o instinto de quem não acredita mais nas aparências. Naquela casa, havia muitas mentiras escondidas atrás de fotos de família, e nem todas vinham de fora. Algumas viviam lá dentro há muito tempo. Naquela noite, a casa estava silenciosa, mas um silêncio diferente. Não era tenso nem triste. Era como se tudo estivesse em espera.
As crianças tinham adormecido rapidamente depois de uma longa tarde brincando com uma caixa de papelão que Sofia havia transformado em castelo. Emiliano fez uma espada com uma colher. Mariana colocou música ambiente enquanto brincavam e não os apressou para tomar banho ou jantar. Adormeceram no sofá assistindo a um filme de dragão. Ricardo os carregou para o quarto, não disse nada, apenas os colocou na cama, os cobriu e desceu com Mariana para a cozinha. Ela estava limpando os restos do jantar.
Havia alguns pratos sujos, uma panela de arroz grudada neles e um copo com meio copo de suco. Ricardo pegou uma toalha e começou a secá-la sem que ela pedisse. Mariana o encarou como se visse algo estranho, mas não disse nada. “Você está bem?”, perguntou ele sem olhar para ela. “Sim, minha cabeça está cheia”, respondeu ele enquanto enxaguava uma colher. “Por causa do diário.” Mariana parou.
“Você sabia que Lucía tinha um?” Ricardo assentiu levemente. “Eu a vi escrever uma vez, mas nunca soube quanto ela colocava lá. Nunca perguntei a ela.” Mariana fechou a torneira. A água parou de correr. Só se ouvia o relógio pendurado na parede. Tique, tique, tique. Ela tinha muitas dúvidas, Ricardo, muita tristeza que não era visível a olho nu. E ela não confiava em todos.
Ricardo largou a toalha, encostou-se no balcão e abaixou a cabeça. Não estava chateado, apenas parecia exausto. “Eu não era o melhor marido”, disse ele sem levantar a voz. “Às vezes me trancava no trabalho, às vezes não via o que estava à minha frente e agora tenho medo de repetir.” Mariana se aproximou um pouco mais. Não sabia se falava ou não, mas algo dentro dela a pressionava. “
Você não está repetindo, você está tentando.” Você chegou. Ricardo olhou para ela. Ela olhou de volta para ele. Não havia música, nem palavras bonitas, nem luzes especiais. Apenas aquele raro momento em que duas pessoas passam mais tempo se olhando do que deveriam. Ele deu um passo. Ela não se moveu. A cozinha ficou menor, mais íntima.
Ricardo estendeu a mão e colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha dela. Mariana engoliu em seco. Seu coração batia tão forte que ela achou que conseguia ouvi-lo. “Posso?”, ele disse, sem entender. Mariana assentiu e entrou. Um beijo que não era nada fora do comum, nada exagerado, apenas os lábios dele tocando os dela. Quente, verdadeiro, o tipo que não busca impressionar, apenas conectar. Quando se separaram, Mariana baixou o olhar.
Ricardo também. Os dois sorriram levemente. “Não sei o que foi isso”, disse Mariana. “Nem eu”, respondeu Ricardo. Ficaram ali por mais um tempo sem falar. Então ela voltou para a pia e lavou a última louça. Ele pegou o paletó e acenou para se despedir. “Descanse um pouco, Mariana, você também.” Naquela noite, Mariana sentou-se na beira da cama, sem saber o que pensar. Ainda não era amor.
Não era uma história de novela, mas havia algo, algo real, algo que não podia mais ser ignorado. Um beijo não muda tudo, mas diz muito, e aquele disse exatamente o que nenhum dos dois ousou dizer em voz alta. Adriana não desistiu. Naquela manhã, entrou na cozinha sem permissão, carregando uma bandeja de biscoitos caros.
Sentou-se à mesa de jantar, sacudiu o guardanapo e os colocou diante de Chayo e Mariana. “Um pouquinho para cada um”, disse com aquela voz fria. Mariana olhou para ela, mas não disse nada. Chayo revirou os olhos em silêncio. Adriana se levantou e foi direto para a sala de Ricardo. Mariana e Chayo a observaram passar. A tensão era evidente. Um minuto, dois se passaram.
Então Adriana saiu com um envelope na mão e o entregou a Chayo. “Por favor, entregue ao chefe quando ele estiver sozinho.” Chayo o guardou sem olhar. Meia hora depois, Ricardo apareceu e encontrou o envelope em sua mesa. Abriu-o e tirou algumas fotos impressas. Eram de Mariana, uma com as crianças no mercado, outra na cozinha e mais uma dele e dela caminhando perto do jardim. Fotos que alguém havia tirado com cuidado. Ricardo franziu a testa.
Adriana entrou e se manteve firme. “Quero te avisar sobre uma coisa, irmão, e é melhor que você ouça de mim do que de outra pessoa.” Ricardo olhou para ela. “Sobre o quê?” Adriana deixou o envelope ao lado das fotos. Sobre Mariana. Ele abriu as fotos e as olhou, sem entender. “Como assim?” Adriana permaneceu em silêncio por um segundo, como se estivesse medindo sua temperatura. “Dizem que essa mulher tem um passado complicado.
Você sabe o que dizem na cidade onde ela morava? Deixe-me mostrar outra coisa.” Da bandeja, ela tirou recortes de jornal e capturas de tela de redes sociais. Diziam coisas vagas. Possível fraude. Babá demitida por desacato. Casa grande vendida por ela sem nenhum contexto real. Mariana apareceu apontada nessas imagens. Ricardo olhou para cima furiosamente.
Isso não é verdade. Adriana empurrou as provas para a mesa. Você acredita ou não? Mas estou te avisando, porque se isso der errado, você vai ficar no meio. Vai perder a guarda das crianças, seu prestígio, tudo. Mariana apareceu no escritório sem que ninguém percebesse. Ela ouviu cada palavra. Seu mundo estava desmoronando.
Ricardo viu Mariana parada ali, com os músculos tensos, e olhou para os papéis, depois para ela. “É verdade?”, perguntou. Mariana balançou a cabeça. “Não, nunca. Não sei quem disse isso.” Ela parecia vulnerável. Ricardo se virou para Adriana. “Onde você conseguiu isso?” Ela ergueu o queixo. “Procurado. Está na internet.” Ricardo pegou alguns papéis e começou a queimá-los com um isqueiro. Adriana abriu a boca para dizer algo, mas ele a interrompeu. “
Isso não importa para mim. Você entendeu?” Adriana não disse nada, apenas respirou fundo e saiu sem olhar para trás. Ela andava com firmeza, os saltos batendo contra o piso. Mariana saiu do escritório. Ricardo a encontrou na porta. “Desculpe”, disse ele com a voz cansada. Mariana olhou para ele e tentou se recompor. “Não vou te decepcionar.”
Ricardo a abraçou e, pela primeira vez, falou como pai e como parceiro. Eu acredito em você. Aquele abraço não era sobre trabalho, era sobre família. O que Adriana fez não só semeou dúvidas, como também ativou algo dentro de Ricardo, a necessidade de proteger aqueles que ama. E Mariana, sem dizer mais nada, sabia disso e sentia que a atitude de Adriana não passaria em branco. Naquela noite, Mariana não jantou.
Não estava com fome. Sentou-se na lavanderia com a cabeça encostada na parede e os olhos fixos no nada. Suas costas doíam, mas seu coração doía mais. Não por causa das fotos ou do que Adriana havia dito; ela já havia passado por isso. O que doeu foi ver como tudo o que ela havia construído com as crianças poderia ruir em um segundo, só por causa do que outra pessoa decidiu dizer sobre suas vidas. Ricardo não insistiu. Ele
a deixou sozinha, mas pediu a Chayo que lhe trouxesse um chá. Mariana mal tocou. À meia-noite, bateu à porta de Ricardo. Ele abriu com um suspiro de cansaço. Sem palavras, Mariana entrou e sentou-se no sofá. Ele também. Houve silêncio por alguns segundos. Então ela falou. Sim, eu tinha problemas, mas não como eles descreveram. Ricardo apenas ouviu. Eu tinha um irmão mais novo chamado Miguel.
Quando éramos crianças, ele ficou muito doente. Meus pais não tinham dinheiro. Às vezes, comíamos em dias alternados. Eu cuidava dele. Fiz sopa com água, arroz com ar. Um dia ele adormeceu e não acordou. Ricardo engoliu em seco. Mariana continuou. Não foi minha culpa, mas eles me julgaram. Disseram que eu o negligenciei, que não fiz o suficiente. Eu tinha 14 anos.
Ricardo, o que eu podia fazer? Era daí que vinha tudo. A raiva, a culpa, a forma como as pessoas me viam. Saí da cidade. Mudei de nome por um tempo. Trabalhei limpando casas, cuidando de crianças, sempre com a ideia de poder ajudar alguém. Como eu não podia ajudar Miguel, Ricardo não sabia o que dizer.
Mariana olhou para ele com os olhos marejados. E pronto. Eu não sou um perigo. Não sou uma ladra, apenas alguém que teve que começar do zero muitas vezes. Ricardo se levantou, andou de um lado para o outro na sala e se aproximou. E por que você está me contando agora? Porque eu não quero que ele te conte, Adriana. Quero que você ouça isso de mim. Ricardo se agachou na frente dela e pegou suas mãos.
Obrigado. Naquela noite, nada mais aconteceu. Não houve beijo, nem abraço, nem carícias. Apenas duas pessoas que se olhavam com respeito, com verdade. Duas pessoas que não guardavam mais segredos uma para a outra. No dia seguinte, Ricardo não permitiu que Adriana descesse para tomar café da manhã com as crianças. Pediu que ela fosse embora.
Disse que ela não seria mais bem-vinda se viesse semear dúvidas. Mariana aprendeu isso com Chayo, mas não fez mais perguntas porque agora havia se livrado do que carregava. E pela primeira vez em muito tempo, não sentiu culpa, apenas alívio. Depois que Ricardo confrontou Adriana e ela foi embora naquela manhã, algo mudou na mansão.
Não era mais apenas um silêncio constrangedor; agora havia tensão no ar. Mariana sentia isso a cada passo que dava pelos corredores. Inimigos, a cada olhar que Chayo a expulsava da cozinha, a cada gesto que as crianças faziam ao olhá-la antes de dormir. Ricardo voltou a ser o pai próximo, mas também mais sério. Era cuidadoso com cada palavra. Às vezes, quando falava com Mariana por perto, sussurrava um pouco, não para esconder, mas para conter.
Mariana percebeu isso novamente quando decidiu falar com Sofía na sala de jogos. Sofía olhou para ela e disse simplesmente: “A tia Adriana acabou de sair”. Ela não perguntou por quê, não disse: “Que bom que ela foi embora”. Ela simplesmente declarou um fato e permaneceu em silêncio. Era uma criança, mas entendia mais do que qualquer um pensava. Chayo estava cada vez mais na defensiva. Ele a olhava com uma expressão interrogativa.
Perguntou o que ela estava fazendo em certos cômodos. Perguntas que mal soavam como sussurros e chegavam aos ouvidos de Mariana. Ela respondeu calmamente e continuou seu caminho sem parar. Mas aquele som de unhas no vidro enquanto Chayo limpava as janelas era como um julgamento silencioso. A troca de olhares começou. Ricardo e Mariana queriam conversar ao mesmo tempo, mas se contiveram.
Na mesa da sala de jantar, os pratos estavam se enchendo de comida quente, mas ninguém falava muito. Uma noite, Sofía perguntou por que ninguém mais falava da mamãe. Ricardo tentou dar uma resposta direta, mas ficou preso no meio do caminho. Mariana preencheu o silêncio. Podemos conversar quando você quiser.
Ricardo olhou para ela e sorriu como se dissesse “obrigada”. Dias se passaram sem que Adriana retornasse. O que eles pensavam que traria calma, na verdade, trazia mais perguntas. Mariana encontrou uma carta enrolada em um dos livros de Lucía que havia sido esquecido. Ela a abriu. Estava incompleta, mas dizia algo como “Eu não confio nele quando”, e parou. Mariana sentiu que não era mais apenas uma novata na casa, ela era outra pessoa.
Alguém que sabia o que havia sido deixado para trás nos cantos. Um dia, enquanto as crianças brincavam no jardim, Ricardo sentou-se com Mariana na grama. Sua mão procurou a dela. Ele não queria falar, só precisava sentir. Mariana apertou seus dedos. Ela estava pensando em tudo isso também. O diário, as cartas, os olhares, as suspeitas que ninguém dizia em voz alta, mas que pairavam em cada esquina.
À noite, quando acenderam as luzes da sala de jantar para o jantar, Chayo não apareceu. Mariana foi até a cozinha e a encontrou limpando um prato. Ela se aproximou. “Algo errado?”, perguntou Mariana. Chayo não respondeu de imediato. Então, disse: “Só estou limpando, para não pensar”. Mariana entendeu que não era por causa dela, mas por tudo o que estava acontecendo, e também entendeu que cada pessoa ali estava vivenciando seu próprio terremoto.
Naquela mesma semana, Emiliano acidentalmente quebrou um copo enquanto brincava. Quando Mariana foi abraçá-lo, ele recuou e gritou: “Não faça isso!”. Com aquela vozinha entrecortada, Mariana parou. O copo ficou entre cacos de vidro e suco. Ricardo veio correndo. Sofia começou a chorar. Houve um caos, mas tudo aconteceu rápido. Mariana limpou tudo.
Ricardo pegou o menino. Sofia abraçou o irmão, e então um silêncio profundo se seguiu. Ricardo olhou para Mariana. “Não queremos isso”, disse ele. “Eu sei.” Ele respondeu: “Mas isso é parte do que precisamos curar”. Mariana assentiu, e novamente aquela conversa ficou apenas entre eles. Ninguém disse nada em voz alta, mas estava tudo lá.
Naquela noite, antes de dormir, Mariana sentou-se um pouco ao lado dos gêmeos. Disse-lhes que tudo ia ficar bem e contou-lhes uma história simples, sem moral nem lições, apenas uma história inventada sobre um casal de irmãos que, embora às vezes duvidassem um do outro, sempre se amaram. As crianças ouviram-na adormecer. Quando ela caminhava pelo corredor, cruzou-se com Ricardo. Os dois olharam-se.
Sabiam que estavam juntos naquilo. A tensão não tinha desaparecido. As suspeitas continuavam a pairar, mas agora havia algo mais, uma aliança, um laço que não se via, mas que era fortalecido pela verdade partilhada, pelos medos confessados ​​e pelas pequenas certezas que iam construindo passo a passo.
Nada era perfeito, nada estava resolvido, mas pelo menos agora sabiam o que tinham que enfrentar, e essa ideia, pela primeira vez, os fez sentir que podiam lidar com qualquer coisa. Aquela sexta-feira começou muito corrida. Mariana foi a primeira a acordar. Ela arrumou as mochilas na noite anterior, mas ainda assim conferiu tudo três vezes.
Colocou os sanduíches em sacolas, suco, biscoitos, uma muda de roupa para o caso de precisar e protetor solar. As crianças estavam animadas. Iriam ao zoológico com a escola. Era a primeira excursão escolar desde a morte de Lucía. Ricardo tinha uma reunião cedo, mas antes de sair, abaixou-se até a altura de Sofía e Emiliano. Ajeitou as mochilas, beijou-os na testa e olhou para Mariana.
Obrigada por terem vindo com eles. Ela apenas assentiu com um sorriso. Sabia que Ricardo não estava dizendo aquilo por obrigação. Ele realmente confiava nela. O ônibus já estava estacionado na entrada da escola. Mariana chegou com as crianças, e elas se alinharam com o grupo. As outras crianças estavam animadas, pulando e falando alto. Os gêmeos se aconchegaram perto de Mariana, como se o barulho os incomodasse.
A professora responsável, uma mulher de olhar bondoso, cumprimentou Mariana com um sorriso aliviado. Obrigada por terem vindo. Às vezes, eles ficam nervosos com tanto barulho. Mariana entendeu tudo só com essa frase. A viagem de ônibus foi longa. Sofía sentou-se perto da janela. Mariana no meio, Emiliano do outro lado. Eles não conversaram muito. Observaram a paisagem passar. De vez em quando, Mariana apontava para algo.
Uma loja em formato de castelo, uma casa com um jardim florido. Emiliano deu um meio sorriso. Sofía pegou seu caderno e começou a desenhar árvores. Quando chegaram ao zoológico, cada grupo desceu em fila indiana com seu guia. Mariana esteve com eles o tempo todo. No início, Emiliano não soltava sua mão. Sofía caminhava com passos curtos,
olhando ao redor. Não era medo, era algo mais. Como se já não se sentissem parte daquilo, foram para a área das girafas e depois para a área dos pássaros exóticos. Mariana comprou sorvete para eles. O dia transcorreu tranquilamente até a hora do almoço. Os grupos se separaram. Mariana sentou-se a uma mesa sob uma palapa com as crianças e outras duas mães.
Enquanto abria as mochilas, notou que Sofía estava estranha, muito quieta. Ela não queria comer. Emiliano olhou para ela, mas não disse nada. Mariana se inclinou. “Está tudo bem, Sofía.” A menina balançou a cabeça. Mariana colocou a mão sobre a dele. “Não
“Quer ir ao banheiro?” Sofía apenas olhou para ela, com os olhos brilhando. Mariana entendeu imediatamente, levantou-se com ela e a conduziu para longe do grupo. Sofía sentou-se em um banco e começou a chorar. Mariana agachou-se até a altura dela e não disse nada. Ela esperou. Quando a menina conseguiu falar, disse em voz baixa: “Viemos aqui com minha mãe”. Mariana sentiu um nó no peito. Ela nos trouxe e disse que os ursos eram nossos tios. Mariana riu baixinho. “
E os tigres eram nossos primos”, respondeu a menina com um sorriso molhado. Emiliano veio correndo. “Está tudo bem.” Mariana o abraçou. “Sim, só nos lembramos de coisas bonitas.” Emiliano sentou-se ao lado da irmã. Eu também me lembrei da foto com os elefantes. Papai a tem na mesa. Mariana abraçou os dois com um abraço apertado. Ela
apenas o abraçou, e os três ficaram ali em silêncio, com o barulho do zoológico ao fundo e as lembranças flutuando entre eles. O resto do dia foi mais tranquilo. Mariana comprou pulseiras em formato de animais para eles. Sofia escolheu uma de tartaruga. Emiliano, uma de leão. Mariana não queria nenhuma. “Eu sou a guia. Vocês são os exploradores.”
As crianças sorriram. No caminho de volta, ambos adormeceram encostados em Mariana, um de cada lado. Ela os cobriu com seus casacos e olhou pela janela. Pensou em tudo o que não se pode dizer com palavras, em tudo o que se cura apenas por ser, verdadeiramente ser. Quando chegaram em casa, Ricardo os recebeu na porta.
Mariana saiu primeiro, depois as crianças correram para abraçá-lo. Ele pegou os dois no colo ao mesmo tempo. “Vocês se comportaram?” “Sim, mas me deixou triste”, disse Sofia. Ricardo a olhou sério. “Por quê? Porque eu me lembrava da mamãe.” Ricardo engoliu em seco. “Eu também me lembro muito dela.” Mariana apenas observou. Ricardo olhou para cima. “Obrigada por tudo, Mariana.” Ela sorriu.
Nada mais era necessário. A excursão escolar não tinha sido apenas uma excursão, era um teste. E embora ninguém dissesse isso em voz alta, sabiam que Mariana não era apenas a babá; ela era a pessoa que sabia carregar lágrimas, risos e lembranças sem desabar. O clima na mansão estava tenso como nunca antes. Adriana havia retornado sem avisar.
Mariana a viu na sala de estar, em pé ao lado do piano antigo, olhando fotos de família. Ela estava com os braços cruzados e um sorriso frio. Ricardo apareceu ao seu lado com um olhar duro. Tudo prenunciava uma tempestade. Adriana falou primeiro, sem dizer oi. “Eu só vim terminar o que comecei.” Ricardo olhou para ela sem dizer nada.
As crianças estavam escondidas no corredor, mas conseguiam ouvir. Mariana se colocou entre elas e Adriana para protegê-las. Adriana riu baixinho. “As crianças não vão entender, mas você vai.” Ela olhou Mariana nos olhos. “Eu trouxe uma coisa que vai fazer você correr.” Ricardo se aproximou. Adriana pegou um envelope e jogou no chão na frente dele.
Fotos, documentos, contas antigas com a assinatura de Mariana. Uma mistura de acusações, supostas dívidas não pagas, contas negadas, referências falsas. Mariana sentiu um buraco se formar no estômago, mas respirou fundo; nada que não pudesse suportar. Ricardo pegou o envelope com cuidado. A tensão era cortante como uma faca. Adriana os observava, satisfeita.
“Meus papéis?”, perguntou Mariana com voz firme. “Agora você quer ouvir.” Adriana assentiu. “Eu ouvi tudo isso de um investigador particular. Dizem que você mentiu no seu currículo, que roubou documentos e que pedir dinheiro faz parte do seu hábito.” Mariana estremeceu e cobriu a boca enquanto ouvia. Ela sabia que o que ele estava dizendo parecia sério, mas se recusou a deixar que isso definisse sua vida.
Ricardo abaixou o envelope, olhou primeiro para Mariana, depois para Adriana. Ele estava confuso. Parecia querer proteger Mariana, mas também queria provas. “É verdade?”, perguntou em voz baixa. Mariana balançou a cabeça. “Não, é tudo mentira, falsificações.” Ricardo olhou para cima, procurando qualquer sinal no rosto dela. Não encontrou nada. Sua mão tremia.
Adriana deu um passo à frente. Você tem que acreditar em mim. Eu não queria que chegasse a esse ponto, mas eu avisei. Mariana não recuou. Suas pernas ficaram bambas, mas ela permaneceu firme. Você não sabe nada sobre mim. Você não sabe o que eu passei. Você não tem o direito de arruinar minha vida com mentiras. A casa estava silenciosa. Apenas os relógios tiquetaqueavam.
Ricardo colocou o envelope em uma mesa próxima. Fechou os olhos e respirou fundo. Quando os abriu, sua voz estava mais clara. Se tudo isso é mentira, vamos provar. Ele olhou para Adriana. Quem inventou isso? Ela apenas o encarou com desprezo. Eu não me importo. O que importa é que você foi avisada. Ricardo a interrompeu.
Não vou agir com base em avisos vagos. Vou investigar. E enquanto não houver provas, não vou acreditar em nada disso. Mariana sentiu um peso sendo tirado de si. Ricardo apertou a mão dela. Você terá meu apoio. Ela mal conseguia sorrir. As crianças saíram lentamente, de mãos dadas. Sofia se aproximou de Ricardo e lhe entregou uma flor.
Uma mala de viagem, mas simples. Ele a recebeu e a guardou perto do coração. Emiliano abraçou Mariana. “Eu nunca vou deixar você ir”, disse ela suavemente. Mariana acariciou sua cabeça. Nunca. Adriana respirou fundo e desceu em direção às crianças. “Elas não sabem o que estão enfrentando.” Ricardo a interrompeu firmemente. “
Nem elas nem você.” Adriana hesitou. Então, ela se virou sem se despedir e saiu de casa. Mariana e Ricardo ficaram olhando a porta se fechando. Não havia alegria nem alívio completo. Havia uma calma tensa como antes de uma tempestade que passou. Mas havia também algo mais, uma promessa silenciosa.
Naquela noite, Mariana ficaria para conversar com Ricardo, e no dia seguinte a verdade real começaria. Não os boatos ou mentiras, a verdade que eles poderiam construir juntos. A manhã seguinte começou com um ar diferente. O sol entrava pelas janelas da sala, mas não esquentava porque havia algo denso no ar. Mariana sentou-se no sofá perto do escritório de Ricardo, segurando o diário de Lucía na mão. Não era coincidência.
Ela precisava conversar. Bateu na porta. Ricardo a abriu sem dizer nada. Eles se cruzaram. Olhares. Ele tremia um pouco, como se não soubesse o que dizer primeiro. “Encontrei outra coisa”, Mariana deixou escapar sem rodeios. “Há evidências no diário de que Adriana e você tiveram algo acontecendo.” Ricardo engoliu em seco, fechou os olhos por um segundo, depois os abriu e sentou-se à sua frente.
Mariana lhe entregou o diário, aberto em uma página. Dava para ver a assinatura de Lucía e aquelas frases recortadas. Adriana viria naquela noite. Ricardo não o largava. Ele não confiava nela. Estava sublinhado em vermelho. Mariana esperou. Ricardo leu lentamente com o polegar. Então fechou o diário e o deixou sobre a mesa. “Sim”, disse ele com a voz trêmula. “Foi um erro do passado.” Fiquei confusa. Mariana olhou para ele sem piscar. Lucía sabia.
Ricardo assentiu. Sim, ele escreveu sobre isso. Disse que doía vê-lo por perto. Mariana sentiu o coração apertar. E você nunca me contou. Ricardo abaixou a cabeça. Eu não sabia como te contar. Pensei que se eu o enterrasse, ele não pesaria mais. Eu estava errada. A sala ficou em silêncio. As crianças escutavam do outro lado da porta.
Sofía agarrou a flor que lhe dera antes. Emiliano abraçou a camisa. Eles não disseram nada, mas ocuparam cada canto do quarto. Mariana respirou. Isso não é o pior, disse ela suavemente. O pior foi o que aconteceu depois. Ricardo olhou para cima. Ela continuou. No diário, encontrei uma página com números.
Era uma conta bancária em nome de Adriana. Há uma linha que diz: “Eu pago pelo favor que você me fez”. Ricardo levou as mãos ao rosto. Sim, foi antes da viagem. Ele me ajudou com um negócio de importação. Foi algo que saiu do controle. Mariana entendeu. “Você pagou por um favor?” Ricardo assentiu, envergonhado. Sim, mas não me arrependo.
Fiz isso sob pressão porque ela queria ter poder novamente. Mariana fechou os olhos por um momento. Lucía sabia disso, disse ela com firmeza. E isso a matou por dentro. Ricardo não sabia o que dizer. Ele levou a mão ao peito. “Tenho tanto a lhe pedir”. Mariana o interrompeu. “Primeiro, quero que você me diga se me ama por quem eu sou.”
Não pelo que você pode ter que provar. Ricardo olhou para ela sem pestanejar. Sim, eu te amo e não quero te perder. Isso foi o suficiente. Mariana abriu os braços. Ricardo se aproximou e a abraçou. Ficaram ali por um tempo, como se o abraço servisse para desabafar tudo o que não tinham dito. E então o som de passos suaves. As crianças apareceram:
Emily com seu leão de pelúcia, Sofi com sua tartaruga. Ricardo colocou as duas no chão e as encorajou a abraçar Mariana. Não houve palavras, apenas abraços lentos, sinceros e sem pressa. A câmera imaginária da história captura tudo. Lágrimas, silêncio, uma família se recompondo exatamente onde havia sido mais destruída.
Aquele momento não foi um grand finale com música repleta de estrelas; foi um pequeno, mas grande começo. A verdade havia vindo à tona com todo o seu peso, e essa verdade, no entanto, abriu a porta para algo maior: perdão, confiança novamente e, acima de tudo, deixar ir os fantasmas. A manhã começou calma, mas parecia diferente. Ricardo não estava no escritório, então Mariana decidiu esperá-lo na sala com o diário de Lucía aberto na mesa de centro.
As crianças brincavam com blocos de madeira por perto, mas de vez em quando olhavam para cima. Sofía arrumou um bloco e perguntou sem olhar para cima: “Você vai ficar bem, Mariana?” Ela sorriu e assentiu, mas seu coração batia forte. Ricardo entrou, parou por um segundo ao vê-lo. Sem mais delongas, sentou-se em frente a Mariana e não disse nada.
Ela olhou para o recorte e então pegou o primeiro recorte de jornal que havia tirado. “Olha isso”, disse ela suavemente. Era outro fragmento daquele papel. Ela o havia puxado com cuidado para não rasgá-lo. Dizia algo que Lucía havia riscado com uma caneta vermelha. “Se ele me beijar de novo como daquela vez, saberei que ele nunca me deixou.” Mariana colocou o recorte na frente de Ricardo. Ele respirou fundo. Seu rosto endureceu.
Ele estava com medo de saber o que estava por vir. Mariana sentiu. “Isso confirma o que eu te disse. Ela sabia.” Ricardo baixou o olhar e segurou o recorte entre os dedos como se pesasse muito na palma da mão. Ela o guarda no diário porque lhe doía. Mariana queria falar, mas deixou que ele continuasse. O silêncio se estendeu. Então Ricardo ergueu os olhos. “
Isso não é apenas uma lembrança confusa. Isso é algo que marcou Lucía e nos marcou também.” Ele fez uma pausa, engoliu em seco. “Estou começando a entender por que ela mudou tanto antes de terminar a frase.” Mariana se aproximou. “Você não precisa mais ficar em silêncio.” Ricardo olhou nos olhos dela e viu naqueles olhos a força de que precisava.
No aniversário dela, ele começou, com a voz rouca. Mariana prendeu a respiração. Naquele dia, Adriana apareceu com um bolo e desculpas. Lucía me disse mais tarde que se sentia traída. Ela não entendia por que Adriana continuava por perto, porque eu a deixei entrar. Mariana assentiu. Era claro que cada palavra era um fardo.
Ricardo se levantou e foi até a janela. Olhou para o jardim. Eu nunca vi aquilo como algo sério. Eu via aquilo como o passado falando. Achei que conseguiria lidar com aquilo, mas ela sentia como uma ferida aberta. Ela abaixou a mão e pegou uma cadeira. Sentou-se perto de Mariana. E o pior foi que eu fiquei em silêncio porque não sabia o que dizer. Mariana se aproximou e pegou a mão dele.
Ele fechou os olhos por um segundo, como se estivesse tentando não desabar. “Amor, eu sei”, disse ela com muita delicadeza. Você não tinha as palavras, mas isso não significa que as feridas tivessem cicatrizado. Ricardo olhou para ela, sentindo o peso de tudo o que não havia dito. Então, abriu os olhos, respirou fundo e disse: “Quando Lucía morreu, me senti livre e culpado, livre da tensão constante entre as duas irmãs, culpado por não ter falado quando mais precisava.
” Mariana apertou a mão dele. Ele acrescentou: “E hoje parece que estou falando pela primeira vez.” As crianças ouviam por perto, sem se mexer. Sofía se aproximou e colocou a mão no ombro de Ricardo. “Papai”, disse ela suavemente; aquela palavra o abalou. Ele se inclinou e a abraçou. “Sofi.” Sofía assentiu. Sem soltar. Emiliano se juntou a ele. Ricardo abraçou os três.
Mariana os uniu. Uma família abraçada no centro da sala. Não havia palavras grandiloquentes, nem declarações eternas, apenas aquele longo abraço em que cada um compartilhava algo. Sofía deixou cair a flor de plástico que trouxera. Ricardo fechou os olhos e a segurou contra o peito. Emiliano apoiou o rosto no peito de Mariana, e ali, no mais puro silêncio, Ricardo descobriu que a verdade, quando chega, não vem com golpes; chega com calma e com um abraço que diz muito, sem falar. Naquele dia, ele descobriu muitas coisas que
havia permitido que acontecessem — mentiras, coisas que havia magoado sem querer — mas, acima de tudo, descobriu que ainda podia amar, confiar e recomeçar. Hoje, ele e sua família descobriram que o próximo passo não era apagar o passado, mas aprender a conviver com ele. E isso, embora não pareça épico, era exatamente a verdade de que precisavam. A manhã já trazia uma energia diferente.
Ricardo levou as crianças para tomar café da manhã e pediu para falar com Mariana na sala. Ela sentou-se calmamente, embora seu coração estivesse acelerado. Ele fechou a porta, respirou fundo e disse: “Hoje precisamos esclarecer tudo”. Mariana assentiu sem falar, olhando-o com firmeza. Não demorou muito para que Adriana voltasse à mansão.
Desta vez, ela não entrou com aquela postura fria. Estava séria, com o olhar fixo nos sapatos. Todos notaram. Chayo desceu imediatamente para o escritório. Mariana o seguiu com o olhar. Adriana entrou e foi direto para a sala, onde Ricardo já estava sentado com as crianças.
Não havia fotos, nem subornos, nem desculpas, apenas uma calma forçada. Ricardo a encarou. Estamos prontos. Adriana ficou tensa, sentou-se elegantemente em uma poltrona, cruzou as pernas e respirou fundo. Mariana estava um pouco afastada, segurando a mão de Sofia. Emiliano estava parado perto, sem se mexer nem falar. Ricardo deixou Adriana começar. “Eu só queria o melhor para você.”
Mariana a olhou com os olhos arregalados. “O que você queria?”, perguntou Ricardo. Ela hesitou. “Achei que Mariana não era o que você precisava.” A sala ficou em silêncio. Nem mesmo as crianças respiravam alto. Mariana deu um passo à frente. “Não era o que precisávamos”, repetiu lentamente. Adriana olhou para ela. “
Fui informada de que você poderia ser uma influência negativa. Suas fotos, as declarações.” Ela não completou a frase. Ricardo olhou para ela. “E isso lhe dá o direito de espionar, espalhar mentiras, vir à minha casa e destruir.” Adriana começou a tremer. “Nunca foi para causar mal, apenas para desestabilizar.” Ele a interrompeu. “Sim”, ela admitiu num sussurro. “
Sim, porque doeu em você ver que eles estavam bem sem mim. Porque você não queria perder o que pensava ser só seu.” Mariana ouviu com o coração na garganta. Ela não tentou falar, mas também não ficou em silêncio. O que lhe dá esse direito? Adriana olhou para as crianças, que permaneceram olhando. “Eu sou tia delas”, disse ela, “mas não sou mãe, e essa diferença é o que você nunca poderia aceitar.” Ricardo se levantou.
“Nós decidimos quem está aqui e quem trouxe mentiras. Ele está indo embora.” Adriana deixou escapar um “Estou sozinha”. Ela não conseguiu terminar. Ricardo olhou para ela, triste, mas firme ao mesmo tempo. “Vá, não volte”, ele indicou a saída com o olhar. Depois de um silêncio pesado, ela se levantou na soleira e parou.
Virou-se para olhar as crianças, respirou fundo e saiu sem se despedir. A porta baixou com um rangido suave, como uma despedida não ouvida. Mariana sentiu o ar mudar no quarto. As crianças se soltaram. Sofía se aproximou primeiro. Abraçou Mariana, depois Ricardo. Emiliano chorou um pouco. Ricardo abraçou os dois. Ele não disse nada. Finalmente, não houve mais conversa.
Um minuto depois, Mariana saiu lentamente, aproximou-se de Ricardo, pegou sua mão e apertou-a. Ele retribuiu o sorriso mais calmo que ela vira em semanas. As crianças estavam guardando seus pratos. Ninguém falou, mas tudo estava tão claro agora que não era necessário dizer uma única palavra.
Adriana havia se revelado sem mentiras, sem fotos, sem manipulação, e depois do susto, a família respirou novamente com a certeza de que o que acontece dentro daquela casa se decide dentro, não fora. A casa finalmente respirava calma. Depois de tanto, os dias pareciam normais. As crianças brincavam sem medo. Mariana sorriu sem culpa, e Ricardo tomou seu café em silêncio, sem a expressão tensa que exibia havia semanas. Tudo estava como deveria ser.
Até que, de repente, Mariana começou a notar algo estranho, algo pequeno. Ricardo se tornou distante. Não era rude nem frio, mas não buscava mais o olhar dela como antes. Não tocava mais na mão dela por hábito, nem ria quando as crianças diziam bobagens. Mariana deixou passar por um ou dois dias. Pensou que fosse cansaço, que ele só precisava de espaço, mas no terceiro dia se aproximou do escritório dele e ouviu uma batida. “
Sim, eu sei, mas não posso continuar com isso se você continuar me pressionando”, disse Ricardo em voz baixa. Mariana não se mexeu; permaneceu atrás da porta, sem querer ouvir mais nada, mas escutava. “Não, eu não contei a ele, porque se eu contar, ele vai embora, e eu não quero que ele vá.” Quando Mariana entrou, Ricardo desligou rapidamente. Seu rosto mudou ao vê-la. Mariana o encarou. “O que está acontecendo?” Ricardo engoliu em seco. Ele não sabia por onde começar. “É algo que eu não planejei.”
Não tem nada a ver com você ou com as crianças. Então diga. Mariana perguntou calmamente, embora por dentro sentisse o coração batendo forte. Ricardo suspirou. “O testamento da Lucía.” Mariana permaneceu imóvel. “E o testamento?” Ricardo se levantou e andou de um lado para o outro no escritório. Lucía deixou uma cláusula.
Ela disse que se eu refazesse minha vida com outra pessoa dentro de três anos após a morte dela, eu perderia a administração total do patrimônio das crianças. Não o dinheiro, nem a casa, apenas o controle legal. E isso, Adriana assumiria. Mariana sentiu como se alguém tivesse puxado o chão debaixo dela. “Você está me dizendo que, se ficarmos juntos, você está dando à Adriana poder sobre seus filhos?”
Ricardo assentiu silenciosamente. Não havia mais nada a dizer. Mariana não gritou, não chorou, apenas se virou e saiu do escritório. Naquele dia, ela não jantou com eles, não leu histórias, não subiu para guardar os brinquedos, trancou-se no quarto e sentou-se em frente à janela. Pensou em ir embora.
Ela pensou que talvez fosse a coisa certa a fazer, que ninguém precisava escolher entre o amor e os filhos. Na manhã seguinte, Ricardo a esperava na cozinha. Mariana desceu com os olhos cansados. Ele se aproximou. Não quero que você vá, mas não vou deixar Adriana tocar nos meus filhos, nem por engano. Então, não sei, mas não posso perdê-los. Nem eles, nem você.
Mariana permaneceu em silêncio. Sabe o que é pior do que perder alguma coisa, Ricardo? Ter tudo e não fazer nada para preservá-lo. Ricardo abaixou a cabeça. Os dias seguintes foram estranhos. Ela não foi embora, mas também não era a mesma. Tornou-se mais quieta, mais prática, menos como Mariana e mais como a babá que fora no começo. As crianças notaram.
Emiliano ficou bravo com Mariana por não jogar. Sofía parou de ler histórias para ele. Chayo apenas a observava sem interferir, mas todos sabiam que algo havia quebrado até que Sofía entrou no escritório de Ricardo uma noite e disse algo que o desarmou. Pai, se Mariana for embora, eu também posso ir com ela. Ricardo congelou. Sofía o abraçou.
Ricardo a abraçou forte e entendeu que o obstáculo final não era a vontade, era o medo, e se ele não o enfrentasse, perderia todo mundo. E naquela noite ele finalmente decidiu o que faria. Não com palavras, mas com ações, porque às vezes essa é a única maneira de consertar tudo o que as palavras não alcançam.
Sofía encontrou a carta dobrada dentro do seu caderno de desenho. Não estava lá na noite anterior. A folha de papel era simples, escrita com caneta azul. Seu nome estava escrito em letras grandes. Com um coração ao lado, ela o reconheceu instantaneamente. Era de Mariana. Ele sentou-se na cama e desdobrou-a cuidadosamente, como se fosse algo frágil, como se apenas tocá-la pudesse quebrá-la. Emiliano a observava da outra cama. Em silêncio.
Ela não disse nada. Esperou. Sofia começou a ler em voz baixa. Olá, Sofi. Se você está lendo isso, é porque eu posso não estar mais em casa. Não porque eu queira ir embora, mas porque às vezes os adultos precisam tomar decisões que nem eles entendem, e isso dói, mas não significa que eu te ame menos.
Sofia sentiu a garganta fechar, abaixou a página por um segundo, engoliu em seco e continuou. Desde que cheguei, você e Emiliano me ensinaram coisas que ninguém mais havia me ensinado. Você me ensinou a ter paciência, a rir de novo, a brincar como quando eu era criança. Você me ensinou que o amor não precisa ser perfeito, apenas sincero. Cada vez que você segurava minha mão silenciosamente, eu entendia o quão corajosa você é.
Cada vez que você me fazia uma pergunta difícil, eu sabia o quão inteligente você é. E cada vez que você me abraçava sem dizer nada, eu entendia que não estava mais sozinha. Os olhos de Sofia estavam cheios de lágrimas, mas ela continuou lendo. Emiliano sentou-se ao lado dela sem pedir permissão; ele apenas ficou ali olhando a página com ela. Não quero que você se sinta triste. Não vou embora porque quero.
Vou embora porque há coisas nesta casa que ainda precisam ser consertadas, e às vezes, para as coisas darem certo, alguém tem que dar um passo para trás. Mas isso não apaga nada do que vivemos. Quando meu irmão morreu, pensei que nunca mais poderia amar ninguém. E então vocês apareceram e me fizeram sentir que meu coração não estava partido; só precisava de um pouco de ternura. Sofía soltou um suspiro que ela não sabia que estava segurando.
Mariana ainda estava lá naquela página, em cada linha. Não quero que você me esqueça, nem você nem Emy, porque eu nunca vou te esquecer. E se um dia precisar de mim, me procure. Prometo que estarei lá, mesmo que seja só para fazer panquecas ou olhar as estrelas do jardim. Sofía fechou a página com força e a abraçou contra o peito. Emiliano pôs a mão em seu ombro.
Eles não se falaram; não havia necessidade disso. Naquela tarde, Sofía desceu com a carta na mão. Ricardo estava na sala, olhando para o nada. Ele o viu e correu em sua direção. Entregou a carta a ela sem dizer nada. Ricardo a pegou e leu em silêncio. Quando terminou, permaneceu imóvel. Então, apertou a carta contra o peito. “Onde está?”, perguntou baixinho. “
Não sei”, disse Sofia, “mas ela foi embora porque achou que era melhor assim.” Ricardo se levantou. Seu rosto mudou completamente. Não havia mais dúvidas, nem medo. Ricardo permaneceu ao lado de Sofia por mais alguns segundos, contemplando a carta. Então, baixou o olhar e a abraçou delicadamente. Ela se recostou e apoiou a cabeça em seu peito. Emiliano se aproximou e abraçou os três.
Foi um momento silencioso, sem palavras, mas cheio de emoção. Logo depois, Ricardo procurou Mariana. Não demorou muito. Encontrou-a na cozinha lavando louça. Parou na porta, observando-a com delicadeza. Ela o olhou nervosa. Ele não disse nada sobre a carta, apenas pegou sua mão. “Quero que saiba que não vou deixar você ir”, disse lentamente. Ela sorriu com lágrimas nos olhos.
“Não quero te deixar”, respondeu. Eles se abraçaram ali mesmo, entre a louça e a pia. Quando se separaram, Ricardo beijou sua testa. Mariana sentiu que tudo o que haviam sofrido valeu a pena. Naquela noite, depois de colocar as crianças para dormir, sentaram-se no jardim. Ricardo pegou um novo pedaço de papel e uma caneta. Ele pediu a Mariana que o segurasse.
Em voz alta, escreveu uma carta para Sofía com as palavras de um pai e de um parceiro. O quanto eles a apreciam? O quanto eles se importarão com ela? O quanto eles estão dispostos a lutar para permanecer como uma família? Mariana o ajudou a dobrá-la. Ele a colocou em um envelope e escreveu: “Para minha corajosa Sofi”. Eles a guardaram em uma gaveta especial na sala de estar, onde só eles sabiam que estava.
Quando Sofía e Emiliano encontraram o envelope pela manhã, os dois o abriram juntos. Eles o leram com os olhos brilhando. No final, Sofía correu para abraçar Mariana e Ricardo ao mesmo tempo. Emiliano soltou uma risada suave e disse: “Esses caras realmente sabem como fazer algo bonito”. E naquela tarde, enquanto brincavam, Sofía pendurou uma pulseira no espelho de Mariana com a palavra “família”.
Mariana pegou a carta, olhou-a e abaixou a cabeça. Ricardo se aproximou e colocou a mão sobre ela. Os quatro estavam juntos novamente com a promessa de que ninguém jamais os separaria. A carta de Mariana fizera algo importante. Permitiu que Sofía entendesse que às vezes os adultos tomam decisões difíceis, mas que por trás de tudo há sempre um amor enorme.
E aquela certeza, aquele sorriso claro e aquela pulseira pendurada no espelho fecharam um dos capítulos mais incertos de suas vidas e abriram outro cheio de esperança. No dia em que Mariana foi embora, não disse nada às crianças, deixando apenas a carta para Sofía e um abraço esperando na cozinha.
Saiu em silêncio, com a mochila nas costas e os olhos cheios de lágrimas. Não houve briga, nem escândalo, apenas uma decisão que ela tomou com o coração pesado. Ricardo só descobriu quando desceu para tomar café da manhã e Chayo lhe disse que Mariana não estava. Procurou-a na cozinha. Na lavanderia, no jardim. Nada. Então encontrou a carta dela, não para ele, mas para as crianças. Naquele momento, ele soube que não conseguia ficar parado.
“Para onde ela foi?”, perguntou. “Para Chayo.” “Não”, respondeu ela, dando de ombros. “Ela só me agradeceu e me pediu para cuidar das crianças.” Ricardo manteve a carta na mão. Subiu para o quarto das crianças. Emiliano estava sentado na cama, abraçado ao travesseiro. Sofía olhou pela janela. Ninguém chorava, mas o silêncio pesava. Ricardo se aproximou. “
Vamos procurá-la.” Emiliano levantou a cabeça. “Sério.” “Sim, mas preciso da sua ajuda.” Ricardo foi até o escritório, abriu o computador e vasculhou e-mails antigos. Lembrou-se de algo que Mariana lhe dissera certa vez: que ela trabalhava em um café antes de se mudar para a casa, um que cheirava a pão fresco e tocava rancheras o dia todo. “Já chegava”, disse ela. Ele ligou para cinco lugares. Ninguém a conhecia.
Na sexta tentativa, uma voz disse: “Sim, Mariana, ela acabou de voltar. Ela está no bar. Diga a ela que você está procurando por ela.” Ricardo permaneceu em silêncio. Então disse: “Não, só diga a ela que alguém está a caminho.” Vestiu o casaco, pegou as chaves e desceu correndo as escadas. As crianças já o esperavam com as mochilas. Não queriam perder um momento. O café ficava num bairro modesto.
As mesas eram de madeira, as toalhas xadrez. Mariana estava servindo café quando os viu entrar. Seu coração parou e ela congelou com a jarra na mão. Ricardo não disse nada; caminhou até ela. As crianças correram primeiro. Emiliano a abraçou pela cintura. Sofía chorou em seu peito. Mariana envolveu os dois em seus braços.
Ela não conseguia falar; sua respiração era superficial. Ricardo ficou parado, depois se inclinou para mais perto. Tocou a mão dela. “Você não devia ter ido embora. Achei que era a coisa certa a fazer”, respondeu ela, ainda segurando as crianças. “Mas não era o que queríamos, nem elas nem eu.” Mariana caiu na gargalhada misturada com lágrimas, daquelas que só saem quando tudo se quebra e se conserta ao mesmo tempo. Achei que você teria dificuldade para escolher. Agora não tenho dúvidas.
No refeitório, ninguém a interrompeu, ninguém a olhou de forma estranha. A dona, uma mulher com um avental manchado de farinha, os observava da cozinha com um sorriso. Ricardo tirou um pedaço de papel do bolso. Era uma cópia do testamento. Ele havia riscado algo com um marcador vermelho. “Não importa mais o que isso diz, prefiro perder tudo a perder você.”
Mariana o abraçou, fechou os olhos e finalmente respirou em paz. Naquela tarde, os quatro voltaram juntos. No carro, as crianças conversavam sem parar. Mariana riu. Ricardo os observava pelo retrovisor. Ninguém mencionou o passado, apenas o retorno. E embora ainda faltasse um capítulo, naquele momento todos sabiam que finalmente haviam encontrado o que mais precisavam: estar juntos.
Sem medo, sem condições, sem se esconder. O sol brilhava pelas janelas, e os quatro estavam sentados na sala. Não havia pressa, nem nervosismo, apenas umas costas, uma mão, um sorriso. Ricardo tinha um buquê de flores amarelas, algumas que Sofía adora, e um envelope grande.
Mariana o olhava em silêncio, o coração como um tambor. As crianças estavam ao seu lado, animadas, curiosas. Ricardo respirou fundo. “Isto é para você, querida.” Ele lhe entregou o buquê. Mariana o pegou, cheirando-o sem cobrir o rosto. “São para você”, disse ele. Mariana sorriu com lágrimas nos olhos.
Enquanto isso, Sofía e Emiliano abriram o envelope, tiraram um anel e o olharam como se fosse um tesouro. “Doce novo”, perguntou Emiliano, espantado. Ricardo se aproximou novamente de Mariana. Ele se ajoelhou sem drama. As crianças começaram a gritar. “Papai, papai, papai.” Ele levantou a voz para que apenas Mariana pudesse ouvir. “Mariana, você quer se casar comigo?” Mariana ficou em silêncio por um segundo, mas as crianças completaram tudo. Sofía soltou um grito.
Emiliano correu para abraçá-la. Mariana o abraçou de volta, virou-se e viu Ricardo de joelhos, sorrindo. “Você sabe que sim”, ela finalmente respondeu. Ela se abaixou e o abraçou. O anel serviu em seu dedo. As crianças comemoraram com pulos e gritos enquanto os dois permaneceram abraçados. Parecia uma festa improvisada na sala de estar da mansão, mas com mais ternura do que qualquer um imaginava ser possível.
Depois de um tempo, Ricardo se levantou, pegou a mão de Mariana e disse: “Com a sua permissão”, olhou para as crianças, aproveitou o fato de seus olhos estarem arregalados e a situação estar selada. “Sim, podemos formar uma família de verdade.” Sofia deu um pulo. Emiliano gritou sim. Eles abraçaram os três e os beijaram. Depois, foram para o jardim, um lugar diferente onde haviam assado biscoitos, riram, se abraçaram e choraram. Ricardo passou o braço em volta do ombro de Mariana.
“É aqui que eu quero recomeçar”, disse ela, apontando para o jardim e sorrindo. As crianças corriam livremente entre as flores enquanto Mariana e Ricardo observavam, de mãos dadas, seus anéis brilhando ao sol. Eles não fizeram brindes nem discursos; apenas ficaram juntos, observando o vento farfalhar as folhas.
Foi um fim, sim, mas também um começo. O começo de algo que foi ordenado com palavras simples: amor, confiança, família. E assim, assim, esta história termina. Não há fogos de artifício nem grandes promessas, apenas um beijo na testa, o som distante de crianças rindo e a certeza de que este é realmente um novo começo.

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